Neiva se desdobra conscientemente e é vista em dois lugares ao mesmo tempo; ou então ela projeta a luz dos seus olhos e vê cenas distantes, descrevendo com precisão os acontecimentos. Sua maior virtude, porém é sua infinita paciência, tolerância, humildade e amor incondicional. Ela segue de perto as pegadas de Pai Seta Branca esse Mestre Universal, que também se chama Francisco de Assis, Simiromba, Kutumí e que talvez tenha mais outros nomes. Esta é sua autobiografia quase sem retoques. Nossa contribuição foi apenas de a colocar de maneira literária para que fizesse jus a melhor clareza e ela fosse melhor entendida.
Mário Sassi: Companheiro de jornada
Nota: Este livro foi escrito partindo de dois cadernos do acervo deixado por Tia Neiva. Como outros escritos que ela considerava particulares, esses cadernos só me foram entregues nos últimos dias de sua vida, quando ela já estava se desligando do plano físico, havendo dificuldades de contatos conscientes. Talvez devido as suas dores físicas, o plano espiritual misericordiosamente a mantinha no seu etérico, parcialmente desligada do envoltório físico, situação essa na qual a consciência da dor física é menor. Devido a dificuldades de discutir com ela o plano deste livro, tivemos que interpretar os referidos cadernos e chegamos com isso a conclusões de que os mesmos foram escritos em épocas diferentes, relatando os mesmos episódios passados, um de maneira mais simples, pessoal: outro, de forma mais objetiva, mais próxima da linguagem por ela utilizada quando em reuniões a nível de mestrado.
Estamos ainda pesquisando no volumoso acervo deixado por Neiva, escritos de ordem pessoal que nos possibilitem escrever sobre o período compreendido a partir de 1969, quando começamos nossa vida neste lugar que depois se chamou Vale do Amanhecer. Cremos que a maior parte desses escritos sejam de ordem doutrinária, com afirmações de sua clarividência, que proporcionarão, se conseguirmos num plano de trabalho harmonioso, a visão não só de sua vida missionária mas, também, de sua visão do nosso universo, o que será precioso para a continuação de nossa missão.
Tia Neiva descreveu sua vida entre 1957 e 1969 com algumas reminiscências. Em 1969 a Ordem foi instalada no lugar que hoje se chama “Vale do Amanhecer”, onde floresceu o sistema iniciático, com seus templos, falanges e sistemas. Ela planejava contar sua vida também nessa etapa. Mas Deus houve por bem chamá-la para os planos espirituais, ela desencarnou no dia 15 de Novembro de 1985 e esse trabalho foi interrompido.
O editor
Pedem-me o prefácio de “Minha Vida, Meus Amores”, a autobiografia de Tia Neiva, a clarividente que Brasília aprendeu a amar e respeitar e cuja fama ultrapassou nossas fronteiras geográficas. Li o livro de um fôlego só e revivi momentos de encantamento e saudade. Encantamento graças ao colorido, e as cores e vibrações do Vale do Amanhecer, de Mayanti, estão presentes em todas as páginas do volume, e a oportunidade que ele me deu de retomar contato com Tia Neiva, mas viva e atual do que nunca. Ela, como bem definiu o grande Guimarães Rosa, é uma dessas criaturas que não morrem, ficando encantadas “ad aeternum”. Realmente, Tia Neiva viverá sempre através dos ensinamentos por ela veiculados, a “Doutrina do Amanhecer”, mensagem de conteúdo altamente positivo.
Num estilo vivo, com momentos de humor e de emoção, a Autora nos transporta ao seu mundo e nos revela seus instantes de angustia, de perplexidade, de luta e de afirmação. Desfilam diante do leitor atento fatos marcantes na vida dessa mulher extraordinária, ex-motorista de caminhão começou em Ceres-Goiás, e no início de Brasília, e que levaram a despertar para uma vida intensa em dois planos de consciência. A terrena, ou seja, a da viúva de formação católica, sobrinha de padre e de freiras, que se vê constrangida a enfrentar preconceitos de toda espécie para poder manter com dignidade seus filhos, ao volante de pesado veículo de carga. E ela salta de suas páginas envergando seu “culote”, suas botas de cano alto, enlameadas ou empoeiradas conforme a época, sua altivez e seu desenvolto que a vida de acampamento produzia em tais circunstâncias nas pessoas nos primórdios de Brasília, com o despertar de sua clarividência.
A alegria de viver e a coragem de Tia Neiva ressaltam a cada parágrafo de autobiografia, ligando uma lição de amor ao Divino Peregrino, ao Divino Caminheiro, a Quem a clarividente dedicou, em juramento solene, seus olhos. A missionária à procura de seu companheiro místico, do par ideal para a consolidação da Doutrina do Jaguar, nos transmite toda uma variada gama de emoções e sentimentos, ressaltando o divino drama vivido por quem vibrava entre dois planos, entre dois mundos, o dos homens e o de Deus e dos espíritos.
Concluindo esta apresentação de “Minha Vida, Meus Amores”, só me resta dizer: leiam este comovente livro. Bebam desta água cristalina. Mergulhem fundo nesta Doutrina plena de luz e sabedoria. Reflitam-se neste espelho. Tinjam suas mentes com as cores do Conhecimento. Façam-se arautos de uma nova era, de uma era de Paz, Harmonia, de Igualdade, de Auto-realização. Debrucem-se na Estrela Candente para haurir as energias cósmicas que ela concentra. Abracem o papel de missionário de um mundo renovado pela força da razão e da fé nos ideais e nos ensinamentos de Jesus. Façam da nossa Terra um Sol.
Brasília, 29 de julho de 1986
Newton Rossi
“Porque, filho, respondeu ela, porque tudo o que nós estamos fazendo é levar a mensagem do terceiro Milênio para todo este universo, com nossas indumentárias e com a nossa conduta doutrinária. Vinte e cinco anos, vivendo do amor e luz”.
“Acho que não soube fazer a pergunta certa, disse Nestor, talvez eu quisesse perguntar por que a sua clarividência, que é um fenômeno tão fora do comum, tão extraordinário, não causa maior impacto, não desperta a curiosidade dos cientistas, dos teólogos. Para mim, continuou ele, este Vale deveria estar efervescendo de curiosidade”.
É exatamente porque os impactos de minha clarividência não bastavam é que veio, então, a vida iniciática, com suas cores vivas e seus poderes. Só assim é que tivemos a oportunidade de exibir a obra ao seu autor e também junto aos povos. Veja, Nestor, com as vibrações foram tomando lugar em toda a nossa doutrina, nas cores, no Templo e, por fim, nesta Estrela Candente esta grandeza que emite suas Amacês e a energia do Jaguar, para a cura desobssessiva dos cegos, dos mudos e dos incompreendidos. As vibrações aumentaram sem que precisássemos nos afastar do Evangelho um minuto sequer. Sempre, porém, Jesus o Caminheiro, em sua jornada evangélica iniciática, sem dor e sem sofrimento, ensinando a cura desobssessiva e colocando o espírito a caminho de Deus Pai Todo Poderoso. Não podemos garantir que tudo o que está para vir aconteça aqui. Porém haverá alguma mudança estrutural e benéfica, que irá alterar os rumores do pensamento humano, abalando os alicerces da cultura ancestral, consolidada na velha estrada e isso acontecerá aqui.
Filho, não deve interessar ao homem o seu vizinho, mas sim a função que ele desempenha. É verdade que não podemos separar a obra do seu autor, porém, quando eu daqui partir dirão “ o doutrinador e a sua doutrina”. Por isso, meu filho, esqueça essas preocupações de avaliação social, em termos dos componentes ativos, nesta jornada para o terceiro Milênio. Antes eu pensava porque essas Amacês não aparecem nos grandes centros, e obtive a resposta: primeiro, devido ao respeito às velhas teorias do homem, ainda é cedo para mudar estrutura; segundo, porque Jesus já respondeu a essa questão, quando considerou que as mentes dos pescadores eram mais sadias, e não quis desperdiçar o seu pouco tempo de vida na Terra discutindo com os rabinos das sinagogas. Neiva parou, e o silencio se prolongava em torno dela, no crepúsculo daquela tarde calma e tranquila. Seu olhar se alongava no infinito nas grandes coisas da vida. Havia no ambiente um misto de eternidade e doçura. Nestor o jovem Jaguar da Centúria, sentia as palavras de Neiva. Nada lhe doía mais do que quando Neiva lhe falava em partida. Porém, quando eu daqui partir. O Doutrinador e sua doutrina. Quadros lhe passaram pela memória. Neiva sempre rodeada de gente simples. Vez ou outra um “doutor” na roda. Jesus atento com aqueles rústicos pescadores. Lembrou-se de uma aula de Neiva em que ela contara um episódio da vida do Mestre: Ele chegara a casa e Maria, sua mãe, lhe preparara um aposento arrumado com carinho maternal. Para seus discípulos ela fizera um arranjo no estábulo. Pela manhã do dia seguinte, ela encontrou o aposento intacto, e descobriu Jesus dormindo no estábulo com seus rústicos pescadores.
Neiva voltou de seu enlêvo. Seu discípulo inclinou a cabeça atento. Ver e viver. Antes que os sinais da angustia nos obriguem, a ver com outros olhos as novas perspectivas, e nos compliquem. Para se entender, em novas ciências, o que há de mais simples: amor e Deus.
“Por que foi escolhido o Jaguar?”, perguntou Nestor.
Porque ele é um espírito espartano, é o Cavaleiro Verde, o Cavaleiro Especial. Também porque ele vem de um processo penoso, de sua mente científica na luta de Séculos, neste mesmo solo. Hoje sua percepção nos afirma, filho, que os tempos chegaram e não dá mais espaço para as polêmicas, mas tão somente para a sensibilidade do homem iniciado, do homem que não descansa na grandeza de luta e é agraciado pela grandiosidade das energias trazidas do Prana, para retirar o que necessita do seu psiquismo particular para as respostas às perguntas que emergem do fundo de seu coração.
Este homem, este Jaguar é fácil de ser encontrado. Ele é grosseiro e sagas porque é oriundo das cordilheiras espartanas. Porém, ele não suporta ver alguém sofrendo; sai logo, aflito, procurando socorrer quem quer que seja. E logo se torna amável, requintado, afetuoso, sensível s dificuldades dos povos. Sempre que a missão se apresenta sua mão é forte, seu amor espontâneo; não tem superstições nem falsos preconceitos. O Jaguar ama verdadeiramente sua Doutrina e faz dela o seu sacerdócio. Ele acredita na vida e sabe se promover embora seja boêmio. Sua mente é livre de qualquer crença que não seja autêntica e não lhe permita ser ele mesmo. Os Jaguares são sabedores de que a última grande iniciação da humanidade ocorreu pela espontaneidade, unificando e aproximando o homem da sua individualização. Sabe também, que em todo nosso universo o homem está sendo sacudido, no fundo do seu ser, de maneira autêntica e poderosa.
A Doutrina do Amanhecer, ou Doutrina do Jaguar, explica que o homem que tem conhecimento de si mesmo, aumenta sua intensidade vibratória, e isso é o que acontece nesta tribo de Jaguares. Porque só poderá receber tais iniciações, aquele que tiver todas as suas células despertadas, isto é, a célula mental e a célula etérica, livres de superstições.
Neiva voltou de seu enlêvo. Seu discípulo inclinou a cabeça atento. Ver e viver. Antes que os sinais da angustia nos obriguem, a ver com outros olhos as novas perspectivas, e nos compliquem. Para se entender, em novas ciências, o que há de mais simples: amor e Deus.
“Por que foi escolhido o Jaguar?”, perguntou Nestor.
Porque ele é um espírito espartano, é o Cavaleiro Verde, o Cavaleiro Especial. Também porque ele vem de um processo penoso, de sua mente científica na luta de Séculos, neste mesmo solo. Hoje sua percepção nos afirma, filho, que os tempos chegaram e não dá mais espaço para as polêmicas, mas tão somente para a sensibilidade do homem iniciado, do homem que não descansa na grandeza de luta e é agraciado pela grandiosidade das energias trazidas do Prana, para retirar o que necessita do seu psiquismo particular para as respostas às perguntas que emergem do fundo de seu coração.
Este homem, este Jaguar é fácil de ser encontrado. Ele é grosseiro e sagas porque é oriundo das cordilheiras espartanas. Porém, ele não suporta ver alguém sofrendo; sai logo, aflito, procurando socorrer quem quer que seja. E logo se torna amável, requintado, afetuoso, sensível s dificuldades dos povos. Sempre que a missão se apresenta sua mão é forte, seu amor espontâneo; não tem superstições nem falsos preconceitos. O Jaguar ama verdadeiramente sua Doutrina e faz dela o seu sacerdócio. Ele acredita na vida e sabe se promover embora seja boêmio. Sua mente é livre de qualquer crença que não seja autêntica e não lhe permita ser ele mesmo. Os Jaguares são sabedores de que a última grande iniciação da humanidade ocorreu pela espontaneidade, unificando e aproximando o homem da sua individualização. Sabe também, que em todo nosso universo o homem está sendo sacudido, no fundo do seu ser, de maneira autêntica e poderosa.
A Doutrina do Amanhecer, ou Doutrina do Jaguar, explica que o homem que tem conhecimento de si mesmo, aumenta sua intensidade vibratória, e isso é o que acontece nesta tribo de Jaguares. Porque só poderá receber tais iniciações, aquele que tiver todas as suas células despertadas, isto é, a célula mental e a célula etérica, livres de superstições.
“Mas, interrompeu Nestor, e a humanidade? A senhora falou do Jaguar e do Doutrinador; e como fica o homem comum?”
O Jaguar espera pela humanidade para o próprio adiantamento dela. Sim, filho, a humanidade e o planeta com seus outros seres estão na luta universal. Seu único objetivo é infundir no homem a necessidade dos últimos preparativos para que essa passagem seja uma conquista harmoniosa. Sim filho, se o homem se mantiver numa doutrina unificante, na passagem das grandes Estrelas, Sívas, Harpásios, Taumantes, Tenários, Tizanos, Cautânenses, Vancários, Sumayas e Sárdios, se ele conseguir a grande fusão e assim souber, espontaneamente, emitir na grande transmutação, ele será protegido e terá a bela condição que é a salvação de uma vida para outra. Porque essas estrelas foram dispostas como um verdadeiro arsenal de forças para a transição de uma vida para a outra.
Meu filho, o mundo está bem perto do inevitável, da transformação que afetará todos os seres de corpo humano. Então filho, sabemos que não podemos ficar a mercê dessa transformação olhando para o céu, se sofremos os desatinos de nossos destinos cármicos. Mas, nada temos a temer, pois é sabido que a dor faz o homem humilde e o amadurece para Deus. Assim será a situação do homem brevemente, diante do imenso painel da realidade universal.
“E como a senhora vê esse painel?”
Vejo que as coisas que hoje desperdiçamos nos faltarão amanhã. Sem saber que já amanheceu, o homem chorará a falta do céu azul, do sol, da lua e das campinas verdejantes. Sem saber onde pisar ele estará correndo o grande perigo da desintegração. Enquanto isso, filho, o homem que já adquiriu as suas asas, esse estará provido da candeia viva e resplandecente, na sua jornada missionária para alimentar e reintegrar os que perderam a sua rota.
“Será então, a escuridão de que falam as profecias?”
Sim filho, a escuridão é a falta de visão, do conhecimento das coisas do céu, do homem que é conduzido pela sua mente sem Deus, e que por isso poderá perder a sua rota e entrar no processo de desintegração. Eis o perigo dos que levam a vida na inconsciência, sem saber o que está acontecendo acima ou abaixo de sua cabeça. É triste, muito triste. Filho, como era triste a vida sem o Doutrinador. Pense na falta de luz, tendo os pés na beira dos pântanos. Entretanto, Deus, o Grande Deus, o imenso farol deste universo, que nos deu Jesus seu filho, que tanto sofreu por nós, e cujo grandioso exemplo de amor continua a emitir do céu luzes para quem precisa, ou para quem já passou o tempo de brincar, e está consciência de sua jornada evangélica.
A esse homem nada lhe falta, pois ele sabe que a hora é chegada pela presença do Verbo que segue a luz evangélica de Nosso Senhor Jesus Cristo, servindo de uma vida para outra, desintegrando e reintegrando na força absoluta de Deus Pai Todo Poderoso. E isso é que representam as Divinas Estrelas do Sétimo Verbo, da origem do Santo Verbo Encarnado, Deus, Pai e Filho. São elas, Acelos do 2º Verbo, Ceanes do 2º Verbo, Geiras do 3º Verbo, Gestas do 3º Verbo, Gertais do 2º Verbo, Xênios do 2º Verbo. Vanulos do 3º Verbo, Mântios do 2º Verbo, Taíses do 3º Verbo. São as estrelas que trazem a faixa evangélica e iniciática da vida e da morte. Nesse ponto a noite já se alongava silenciosa e o Solar dos Mestres, como era também chamada a Estrela Candente, se fazia silencioso, ouvindo-se apenas o chiar do Nêutron, a chamada voz do Silêncio. Nestor ajudou-a se erguer e a foi conduzindo lentamente para o carro. O Jaguar Executivo procurava memorizar o mundo de coisas que acabara de ouvir. Neiva lendo seu pensamento parou ofegante e sorriu. Não se preocupe Nestor que vou lhe dar tudo isso escrito.
Então, em meio aos maiores conflitos eu formava na mente a imagem daquela rica mensagem, Jesus, e sentia sua verdade em todo o meu ser. Uma vez firme, entreguei a Jesus os meus olhos, pedindo que os arrancasse, se eu, por vaidade, enganasse alguém em seu nome. Daí para frente, filho, deixei de me preocupar com os valores sociais e penetrei com respeito no mundo dos espíritos. Mas, como se não bastasse a minha grande dor, e como se todos fossem alheios aos meus conflitos, chegavam de mil lugares diferentes críticas, principalmente de estar rodeada de pessoas pobres e, às vezes, até aleijados. Isso aumentava muito minhas angústias, fazendo com que aquela mulher que existia dentro de mim começasse a se apagar, ela estava se ausentando de si mesma. Oh meu Deus. É difícil animar o corpo quando a alma está ausente! Filho, quantas vezes recusamos a água, sabendo que não podemos viver sem ela! Nesse tempo comecei a aprender a viver no meio de uma multidão silenciosa que me assistia e de outra, barulhenta que me exigia respostas.
A primeira, invisível, estava sempre influenciando, ajudando na aproximação de mundos inesperados, e só Deus sabia o que chegava ao meu misterioso mundo interior. Por isso não sabia mais sorrir. “Sem luta não há evolução”, dizia Mãe Yara. Falava-me deixando que eu visse o seu semblante, que eu não me cansava de admirar. Houve um dia porém que ela chegou com ar mais sério.
“Neiva, disse ela, já fiz de tudo para chegar até você. Já me fiz de aleijada dando o nome de Adelina, mas desta vez a farei saber que o amor é a arma imponderável do espírito missionário. Você já não tem escolha pois a sua missão é divina”.
Eu respondi com algumas palavras compungidas, mas ela as repeliu.
“Em nenhuma de suas vidas você foi piedosa e é por isso que você agora foi escolhida”.
Nestor que ouvia atentamente este relato interrompeu. “Mas Tia, não estou entendendo isso que Mãe Yara lhe disse. Quer dizer que a senhora foi escolhida para esta missão porque nas vidas anteriores nunca foi piedosa? "
Exatamente, meu filho. Nem mesmo eu naquele tempo entendi isso, mas hoje sabemos muito bem o porque. A piedade é a vida religiosa artificial e supérflua que não combina com a força do Jaguar. Como poderia eu criar o Doutrinador? Mas, deixe-me continuar o relato de meu diálogo com Mãe Yara. Ajude-me, me ilumine, continuei, para que seja o que Deus queira que eu seja. Ajude-me para que eu possa abandonar os tristes hábitos do meu passado. Haverá alguém que por acaso, goste de sofrer?
“Não será preciso repudiar os seus tristes hábitos. Não se esqueça de que o belo é o resplendor do verdadeiro. Não saia de você mesma, seja natural, ame o que sempre amou e recuse o que sempre recusou. A única diferença Neiva, é aprender a tolerar os seus amigos, até que você se faça acreditada. Esse será o período mais difícil de sua missão, porém, só Deus conhece Deus”.
Esta última afirmação de Mãe Yara me alarmou e perguntei-lhe: A senhora não conhece Deus?
“Sim, eu conheço Deus em sua figura simples e hieroglífica, como você o conhece”. “Hieroglífica, sim Neiva. Deus é o poder supremo em todas as coisas. Neste planeta, nas plantas, impregnando o prana no aroma das matas frondosas, no mar, no espaço, nas estradas, na porta estreita da vida, na alegria, na dor e no fundo do nosso coração. Neiva, Deus é a energia luminosa que desencadeia as reações dos seres vivos, dos vegetais, que vive no ambiente inorgânico e gera pelo seu sopro. Neiva seja o mais otimista que puder e permaneça ligada a Jesus”.
E o Cacique Guerreiro Tupinambás? Posso falar com ele?
“Sim, Neiva, o Seta Branca?” O que vem com uma Seta nas mãos. “Diga comigo, meu pai Seta Branca”.
E assim, Mãe Yara foi me preparando para o relacionamento com os espíritos. Havia períodos em que eu me saía bem; outras ocasiões eu estrilava ou não entendia. Certa ocasião uma jornalista, muito amiga, veio passar alguns dias comigo. Ela tinha sido freira durante dez anos. Contei-lhe tudo o que se passava comigo e ela me deu muita força para que eu continuasse. Num daqueles dias, à tarde, fomos para uma festinha na Novacap. Havia muita alegria e o pessoal estava eufórico. Eu estava sentada num banco junto à parede, acompanhando a algazarra, quando alguém passou por mim com uma bandeja cheia de copos de cerveja. Estendi a mão para apanhar um copo quando ouvi uma voz bem mansinha no meu ouvido.
“Neiva, não beba, veja, esses copos estão sujos”.
Eu vacilei, sem saber o que fazer e permaneci com a mão estendida, enquanto a bandeja passou. Alguém, perto de mim percebeu que eu não apanhara o copo e se levantou fazendo menção de ir pegar um para mim. Nesse momento aconteceu algo inesperado: alguém esbarrou num copo cheio de cerveja derramando em mim e no meu prestimoso amigo. O incidente quase provocou uma briga. Eu estava com uma calça bege que ficou encharcada de cerveja. Na confusão que se seguiu muitos se aproximaram de mim, querendo saber o que havia acontecido. A minha amiga jornalista se divertiu muito com o incidente. Eu por minha vez passei o resto da festa sentada com meu inesperado e prestimoso protetor.
Ele era um engenheiro que havia chegado recentemente que só falava na Novacap e na família que deixara em casa. Eu me lamentava. Sabe Bené, eu vi quem derrubou aquele copo! Ele me olhou e me disse com ar paternal: “Deixe de se impressionar, Neiva, assim você vai acabar ficando louca”.
Os dias foram passando e meu conflito aumentando. Um dia tomei uma decisão e junto com minha amiga fui falar com Dr. Sayão. Ele era amigo de minha família, tinha sido o chefe do meu falecido marido em Ceres e eu tinha muita confiança nele. Ele me ouviu com muito carinho, pensou bem e me disse: “Neiva, sabe, nós já temos um psiquiatra aqui no hospital do I.A.P.I., porque você não faz uma consulta com ele?"
Isso levantou minhas esperanças. No dia seguinte fui ao acampamento do antigo I.A.P.I. onde havia um hospital construído em madeira, aliás, o único daquele tempo em que Brasília era apenas obras em andamento. Eu gozava de muito prestígio entre o povo daquele tempo, pois a única mulher a dirigir um caminhão, de forma que não tive muita dificuldade em conseguir o atendimento. O médico aparentava ter uns 40 anos e demonstrava um ar de cansaço. Percebi logo que ele ainda não estava adaptado ao ambiente de obras e balbúrdia de Brasília. Embora tudo fosse de madeira, o consultório onde ele me atendeu era muito arrumado, não faltando inclusive o sofá alto para exame dos pacientes, uma pia com torneira, uma estante com alguns livros e um biombo num canto da sala. Ele olhou para minhas botas de cano alto e meu culote, e vi por trás de seus óculos que ele não estava ainda acostumado com nossa vida de acampamento, com as ruas enlameadas e com o ar desenvolto que tais circunstâncias produzem nas pessoas.
Mas logo ele saiu de seu impacto, mandou-me sentar em frente da mesa, pegou a caneta e uma ficha e fez as perguntas de praxe: nome, idade, ocupação, estado civil, etc. que eu respondi com certa impaciência. Ele terminou a ficha, largou a caneta, colocou as mãos sobre a mesa, olhou-me no rosto e perguntou gentilmente.
“Então, em que posso servi-la? O que a senhora esta sentindo?”
Sabe doutor, eu não estou me sentindo muito bem. Acho que estou com estafa, estou tendo alucinações, estou vendo espíritos e o pior é que estou ouvindo tudo. Ouvindo isso ele começou a abanar a cabeça como se tivesse chegado a um pronto diagnóstico e foi logo dizendo: “É..., está me parecendo que a senhora está mesmo estafada. Tem trabalhado muito? No que a senhora trabalha?”
Quando eu lhe disse com uma ponta de orgulho, que era motorista profissional, pois quando eu respondera as perguntas da ficha eu dissera apenas, “motorista”, ele me olhou com mais atenção e continuou com seu monólogo paternal. Nisto senti um calafrio percorrer minha espinha e vi um vulto saindo de trás do biombo. Quase saltei da cadeira, pois pensei que alguém estivera o tempo todo me espionando. O médico deve ter notado minha repentina agitação, pois parou de falar e me olhou com um ar de interrogação. O vulto foi se aproximando e, embora eu continuasse a olhar fixamente para as mãos do médico sobre a mesa eu continuava a ver perfeitamente a figura que se aproximava, notava suas feições macilentas e seu andar arrastado.
Comecei a sentir medo e com a mão direita e o polegar comecei a mostrar para o médico. Ele acompanhou o meu gesto e olhou na direção do vulto. Fez um movimento com as duas mãos, como quem nada estava vendo e reassumiu seu monólogo. Nisso o espírito parou e, com voz pastosa falou: “Boa noite, boa noite.”
Meu gesto se tornou mais agitado e eu comecei a apontar nervosamente para o espírito enquanto ele começou a mostrar certa perplexidade. Enquanto isso acontecia minha mente entrou quase em colapso tal a confusão em que me achava. Eu estava realmente vendo o espírito ou era uma alucinação? Tentando racionalizar as coisas eu esqueci até mesmo de minha conversa com Mãe Yara e comecei a explicar ao psiquiatra que eu era de origem católica, que tinha duas tias que eram freiras e um primo que era padre, que já havia procurado o pároco do Núcleo e que ele mandara como penitência que eu puxasse uma carrada de tijolos para a igrejinha que ele estava construindo. O vulto estava quase junto de nós, e eu já estava me preparando para levantar da cadeira quando o “mortinho” falou: “Diga a ele, e apontava para o médico, diga a ele que sou o Juca, seu pai, eu sei que você está me vendo mas ele não me vê, diga a ele que sou Juca, seu pai, eu morri há dois meses lá no Rio, eu vim ver como ele está. Nós éramos muito ligados, agora eu morri, morri.”
E sua voz foi se tornando mais pastosa, mais sortuda. Aí então eu não resisti mais e também não tive mais dúvida.
"Doutor, Doutor o homem, o espírito, o defunto, ele diz que é seu pai.”
O doutor olhou-me apreensivo.
“ Meu pai”.
Sim, seu pai, ele diz que se chama Juca, e que morreu há dois meses no Rio.
Nem bem acabara de falar quando o médico se levantou, lívido, com as feições transtornadas, os olhos quase fora das órbitas clamando com voz rouca:
“ Meu Pai, meu pai, oh! Meu Deus!, meu pai, onde?, a senhora está vendo ele, como é que ele esta?"
Não sei se foi aquela cena patética ou se foi o fato de que eu chegara com esperanças de meu caso ser de simples psiquiatria e poder ser resolvido com remédios mas, a verdade é que naquele instante, vendo o espírito de um defunto (que não parava de falar e acenar em direção ao médico), vendo um cientista alucinado com a simples menção de um mortinho, eu entrei em pânico, colapso nervoso, nem sei o que. O fato é que me levantei com violência e tentei sair por onde entrara. Não sei se a fechadura ou trinco emperrou, mas o fato é que eu sentei o pé na porta com tal violência que a porta abriu ao contrário e ficou dependurada nas dobradiças caídas. Com a mesma violência entrei no meu internacional e não respeitei nem seu “queixo seco”, engrenei vigorosamente e sai sem saber bem o que estava fazendo. Chegando em casa chorei, chorei muito.
Eu conheci Mãe Yara numa cadeira de rodas como uma senhora aleijada que se chamava Adelina. Outras vezes ela vinha com uma roupagem diferente e eu a chamava de “Senhora do Espaço”, mas eu sabia que era o mesmo espírito. Como Adelina ela fingia ser uma pessoa que sofria muitas dores e que precisava de orações para se curar. Ela fazia então que eu a acompanhasse rezando o Pai Nosso e foi assim realmente que aprendi a rezar. Depois da tempestuosa visita ao psiquiatra e depois de haver chorado muito, comecei a me lembrar dos conselhos da Senhora do Espaço:
“Se você insistir em pensar no mal, na dor, na doença, você atrairá essas coisas para si mesma." A planta extrai do solo vários elementos medicinais; no entanto, precisamos conhecê-las, se quisermos nos servir delas, porque muitas são mais venenosas que o veneno das serpentes. Neiva ajude sempre sem exigir condições, ajude com desprendimento, não exija agradecimentos nem espere gratidão. Na verdade quem ajuda ao próximo, está na realidade ajudando a si mesmo: Não minta para que o seu sono seja tranqüilo. Procure descobrir sua estrada na vida, sem profetas nem profetizas. Cabe a nós descobrirmos o nosso próprio caminho, a estrada que escolhemos e segui-la com nossos próprios pés. Desperte para a vida, para a verdadeira vida. Não desanime frente aos obstáculos; eles são atraídos pela força dos nossos tristes pensamentos. Não se impressione com os sonhos e não fique a querer interpretá-los; o sonho é a arma dos supersticiosos. Procure o lado bom da vida, seja otimista. Procure subir e espere sempre o melhor; com o coração esperançoso, teremos tudo das coisas boas e nobres que desejamos. O pensamento e a palavra têm poder curador.
O corpo é o veículo através do qual, no planeta Terra, se manifestam a alma e o espírito, dos quais ele é apenas o reflexo material. Não transfira os problemas, procure solucioná-los e só a Deus entregue o seu amor.
"Filha guarde as suas preces; um coração em conflito, muito pouco poderá se elevar a Deus. Você vive uma densa noite, porém, eu não a abandonarei”.
Pensei comigo: preferia que me abandonasse, ela sorriu e continuou: "A sua luz filha, brilha de dentro para fora. Mantenha os seus amigos, seja forte nos embates da vida. A purificação está além de tudo, dos falsos preconceitos sociais e das mesquinharias da vida. É muito longo o caminho do amor, principalmente para você, que será um enigma deste planeta até a sétima dimensão. Vá Neiva, vá caminhando, distribuindo o bem que Deus lhe deu, com gestos de carinho, usando sempre esta honestidade sã e pura. Você jamais será abandonada. Seja alegre e confiante como sempre foi. Não deixe que a calúnia perturbe a sua mente; não se nivele ao caluniador, para que não seja igual a ele. Não responda e nem se altere; vá e continue sua estrada mesmo com seus conflitos”.
“E seus pais, seus parentes, seus amigos, como é que eles estavam vendo as coisas que lhe aconteciam?" Perguntou Nestor.
Realmente eu pensava muito neles. Meus pais. Como ficará tudo isso? Eles não gostam de “macumbeiros” nem de mulheres independentes, e só pela minha “ousadia” de ser uma viúva que queria viver sua própria vida, já me haviam expulsado de casa uma vez, iriam me expulsar novamente? E meus tios, meus primos, padres e freiras, o que iriam pensar? Mas afinal, pensava eu, porque eles não me dão proteção? Pelo que eu sabia o sacerdócio deles era um poder que protegia a família até a quinta geração. Não restam dúvida que eu terei alguém para me proteger, me ajudar junto ao céu, junto a Deus. Isso apesar de eu ser uma viúva e de viver “sem sacrilégio” conforme me disse uma vez um padre.
Neiva estava nessas cogitações, que a pergunta de Nestor a colocara, quando lembrou do mesmo estado de espírito de muito tempo atrás, ocasião em que se encontrara de repente na presença de Mãe Yara.
“Neiva, deixe de hipocrisias, isso não condiz com o seu espírito evoluído. Quantos anos de vida você já tem na Terra?”
Eu sou de 30 de outubro de 1925.
“Sim, filha, você tem 33 anos”.
É Mãe Yara, vou deixar um mundo que ainda tenho na minha frente, um mundo que amo, no qual vibro e tudo isso para me tornar uma beata curandeira.
“É verdade filha, se você não tiver uma super-personalidade, vai se tornar uma “mãe de santo” que é muito pior do que ser uma “beata”. Sim, muito pior no seu caso, porque a mãe de santo veio preparada para ser isso, uma mãe de santo, enquanto que você veio para continuar a jornada de Amon-Rá, Aknaton e suas grandes realizações no delta do Nilo. E o que dizer de Pítia de Delfos com seu Deus Apolo, hoje unificado em Cristo Jesus, graças a essa mesma Pítia”.
Eu estava muito magoada, imersa em meus próprios conflitos e não podia entender as misteriosas revelações que Mãe Yara me fazia. Pítia, Amon-Rá, Aknaton. Que seria tudo isso?
“Mas, perguntou Nestor, como era então o seu dia a dia, o seu trabalho. A senhora ainda dirigia seu caminhão?"
Minha vida se complicou muito, eu me considero uma boa motorista, e até então havia dirigido por muitas estradas desse Brasil; como você sabe Nestor, nem os carros tinham a mecânica de hoje e nem as estradas eram pavimentadas, a não ser umas poucas nos troncos principais. Pois bem Nestor, eu era respeitada pelos meus colegas justamente por isso, por ser considerada uma boa motorista e boa companheira.
É Tia, eu já tive oportunidade de conversar com antigos colegas seus daquele tempo e eles diziam isso mesmo. Pois é Nestor eu estava com aquelas coisas que Mãe Yara havia me revelado na cabeça, e meu coração estava apreensivo com tanta responsabilidade que me havia sido acenada. Um dia eu sai bem tarde e ainda insegura sobre o que iria fazer. Meu carro estava fichado na Novacap, mas as tarefas eram sempre variadas. Mas sempre elas começavam cedo e não era raro eu estar na rua as cinco ou seis horas da manhã, com a carroceria cheia de candangos para serem levados para os canteiros. Naqueles dias, porém não eram só candangos que andavam no meu carro; muitas vezes aparecia uma senhora muito bonita e simpática que vinha me dar conselhos: Mãe Matildes. Uma vez o Beto, meu filho, estava comigo na cabine e Mãe Tildes chegou dando um recado: “Vai Neiva, vai agora mesmo que tem uma mulher doente esperando por você na sua casa”.
Ora Nestor, eu estava perto da construção do Brasília Pálace, muito longe de minha casa no Núcleo Bandeirante e, por outro lado, estava muito longe do interesse de curar uma pessoa, quem quer que fosse, e me tornar “uma beata curadora”. Reagi irritada com Mãe Tildes, a senhora pensa que não tenho o que fazer? E minhas obrigações? E meus filhos, como é que vou ganhar o pão deles de cada dia?
O Beto que nada estava vendo nem ouvindo ficou assustado. Puxava-me pela manga e me chamava aflito. Eu nessa altura já havia parado o carro e quando percebi a situação disfarcei o melhor possível e expliquei a ele que eu estava conversando com um espírito. Mas nesse dia realmente não consegui fazer coisa alguma e voltei azeda para casa. Depois eu conto o que aconteceu nesse dia. Mas, como eu estava dizendo, eu estava com aquelas coisas que Mãe Yara falara, e nesse dia havia saído cerca de 10 horas da manhã e sozinha. Estava pensando em ir buscar o meu ajudante e guiava relativamente devagar, pois o movimento no Núcleo sempre era intenso, as ruas muito cheias de barracos e o povo muito descuidado. Subitamente, não sei como, meu carro passou por cima de dois homens que atravessava a rua conversando descuidadamente. Tomei um susto enorme e pisei no freio com violência, a ponto de as rodas arrastarem no barro. Meu coração quase saiu pela boca e, num relâmpago o desastre passou pela minha cabeça. Pronto, pensei, estava perdida! Matei esses coitados e agora? Meu Deus! Onde estava minha cabeça? Num relance vi todo meu futuro embaralhado, processo, cassação da carteira, indenizações, vergonha. E meus filhos o que haveriam de dizer? E meus colegas que tanto se orgulhavam de mim como motorista? Tudo por causa desses espíritos que não me dão sossego! Não tive pernas para descer do carro, e só tive tempo de ver o guarda de trânsito se aproximar do carro, antes de deitar no volante e chorar copiosamente. Levantei a cabeça e vi o guarda me olhando com um sorriso irônico nos lábios e, antes que eu proferisse palavra ele se dirigiu a mim numa atitude que achei curiosa: “O que está havendo Baiana, porque essa freada doida, e bem aqui no meio da rua? Você não está vendo que esta impedindo o trânsito?"
Senti um calafrio percorrer-me a espinha e perguntei, apontando para baixo do caminhão, morreram? “Morreram? Quem morreu”?
Os homens, aqueles dois candangos!
Que candangos? Olha Baiana, acho melhor você tirar seu carro do meio da rua. Será que você está biruta? Olha, vou lhe dar um conselho, estou achando você muito estranha ultimamente. Porque você não vai procurar um terreiro?
Disse isso e se afastou balançando a cabeça. A muito custo enxuguei as lágrimas e dei partida no carro me afastando do local. Mais uma peça dos espíritos, pensei com raiva! Mesmo assim ainda dei uma olhada no retrovisor..., nada havia no meio da rua.
“Mas Tia, os espíritos chegavam a esse ponto? Por que isso, não seria mais fácil as coisas virem de forma mais suave, menos chocante?”
Sim, Nestor, teriam sido mais fáceis, se não fosse minha resistência. Eu tenho uma personalidade forte e nunca abri mão dela. Mesmo depois, quando já aceitara minha missão, eu pedi ao Pai Seta Branca que não me obrigasse a abrir mão daquilo que é meu, a personalidade que desenvolvi nos embates de uma vida boa, mas difícil. E o Pai sempre me atendeu. É lógico que tive que abrir mão de muita coisa, do meu temperamento por exemplo. Logo no começo de minha aceitação das coisas eu via o quadro das pessoas e lhes dizia sem rebuços, sem me preocupar se aquilo que dizia iria magoar ou não. Só com o tempo é que aprendi a me controlar e só dizer às coisas que deveriam ser ditas e guardar as outras. Mas aquele dia não terminou aí. Desisti de ir à casa do meu ajudante e resolvi chegar até o Berocan onde havia um posto de abastecimento e um restaurante de um casal de japoneses, meus amigos e velhos conhecidos. Aproveitei a oportunidade e pedi ao lavador do posto para dar uma lavada rápida na carroceria e no chassi, entrei no bar e pedi um café.
Bebi meu café e acendi um cigarro recostada no batente da porta do bar. De onde eu estava eu via o movimento da estrada. Aquela era a única via de acesso ao futuro Plano Piloto e o movimento era intenso. O Posto do japonês ficava bem na esquina da Travessa Berocan, a última travessa que cruzava as três avenidas da Cidade Livre. Até hoje tem um posto de abastecimento nesse mesmo local. Estava ali me sentindo muito magoada e remoendo o incidente de há pouco, quando tive minha atenção despertada por algo que estava acontecendo com um homem encostado no ponto de ônibus, bem em frente de onde me achava. A princípio pensei que fosse reflexo de algum espelho, batendo bem na testa dele ou algum objeto que ele estivesse carregando na cabeça. Mas não, parecia uma coisa impossível! Bem em cima da cabeça formou-se uma espécie de tela de TV e, mesmo eu estando a uma distancia relativamente grande, talvez uns dez metros, eu via perfeitamente uma cena como se fosse um filme. Sem lembrar de indagar se aquilo era mais uma alucinação, fui absorvida pela cena daquela tela fantástica e fui me deixando levar pelo enredo: na tela aparecia o próprio homem, portador daquela “televisão” e ele estava encostado no próprio poste que eu também estava vendo! Nisso a cena se modificou sem que, no foto real, ele se movesse. No “vídeo” apareceu uma parte da estrada e nela caminhava uma mulher pequena, vestida com um branquinho de bolinhas vermelhas. Fascinada eu acompanhava a trajetória da mulher e já adivinhava para onde ela se dirigia, quando uma voz me falou de mansinho no ouvido:“Você está vendo o futuro desse jovem”.
A moreninha de vestido de bolinhas vermelhas carregava uma sombrinha colorida e se aproximou do homem, subiu na ponta dos sapatinhos e deu-lhe um beijo no rosto. Eu olhei cada vez mais fascinada, e na verdade o homem ainda estava sozinho, encostado no poste do ônibus e carregando, agora eu sabia o seu futuro na cabeça! E, por fim, a cena se concretizou; a moreninha, de vestido de bolinhas vermelhas, carregando uma sombrinha colorida, se aproximou, em carne e osso, se levantou na ponta dos sapatinhos e beijou-o no rosto! Pronto, eu havia visto e confirmado um futuro! Mas nisso a coisa esquentou. Eu pensara que uma vez confirmado o encontro, a lição havia acabado e a “TV” iria sumir da cabeça do homem; tal não aconteceu e a cena do “filme” continuou. Só que desta vez foi um ônibus cheio de gente que parou no ponto, um mundo de gente se espremeu, entrou, o ônibus saiu com gente pendurada na porta, e entre eles o casal da “televisão”. Como um filme de verdade passou um lapso de tempo e, horror! Eu vi o ônibus tombando e seis pessoas estiradas mortas no chão, dentre eles o casal que eu estava vendo! só que tudo estava se passando no “vídeo”! Sem sequer pensar corri em direção ao casal, segurei o homem pelo braço e fui dizendo com voz exaltada: “Moço, moço! Não vá neste ônibus, ele vai tombar, e a senhora também, não, por favor, não embarquem neste ônibus, ele vai tombar, vai ser um desastre horrível!"
O homem, muito constrangido, procurava tirar minha mão do seu braço, mais preocupado com o que a sua namorada pudesse pensar do que com o que eu estava falando. A mulher por sua vez também procurava tirar a minha mão do braço do rapaz, e falava com voz ríspida que eu não sei se dirigia a mim ou ao seu namorado. Sei que se formou uma confusão enorme no ponto, o tumulto atraindo as pessoas que se achavam no local, verdadeira balbúrdia. Mas, enquanto isso, o ônibus, de verdade, chegou, as pessoas se espremeram, e o ônibus saiu. Essas cenas de confusão eram comuns naquele tempo. Havia poucos ônibus, os horários eram irregulares e até mesmo os itinerários variavam. Daí o empenho do casal. Voltei assustada para o bar pensando comigo: porque entrara numa situação dessas? Qual o meu interesse? E os outros passageiros? O japonês, muito amável, ele e sua senhora, procuravam me consolar. Eu contei a ele a estória da “TV” na cabeça do homem. Ele não ficou muito convencido, mas, nesse momento o casal veio chegando onde eu estava, a mulher visivelmente irritada, falando em voz alta com o rapaz. O japonês então, num gesto cavalheiresco, procurou contar ao casal a visão que eu tivera, mas não estava convencendo muito a mulherzinha cheia de ciúmes. A “televisão” sumira da cabeça do homem.
Nisso ouviu-se um estrondo, como se fosse uma grande explosão. Todos no bar quedaram silenciosos, um ar de interrogação em cada olhar, e todo mundo correu para fora. Distante um quilômetro de onde nos achávamos a estrada fazia uma curva acentuada para esquerda, aliás, até hoje é a mesma, e isso em cima de um aterro, ficando a curva a uns sete ou oito metros de altura; apesar da guarda de ferro que acompanhava toda a curva, os desastres ali eram frequentes. Não deu outra coisa e do bar do japonês a gente via o povo correndo para o local; o ônibus havia tombado e a notícia chegou rápido: quatro pessoas estavam mortas! O casal se aproximou de mim se desmanchando em desculpas. Falavam qualquer coisa de ficar, devendo a vida a mim e a moça procurava abraçar-me, enquanto que o japonês falava excitadamente para todo mundo o que eu previra. Como no consultório do psiquiatra a minha reação foi nervosa. Repeli o casal com seus agradecimentos e fui saindo de mansinho, calada; algo de muito sério me havia tocado. Eu podia ver o passado, o presente e o futuro e vira o que ninguém tinha visto. Esqueci do caminhão e fui caminhando para minha casa que não era muito longe do local. Pensava. Como seria a minha vida dali em diante? Agora eu estava convencida de que realmente eu poderia ajudar as pessoas, como havia ajudado aquele casal. Com a cabeça cheia de pensamentos e o coração apreensivo andava lentamente. Se eu era essa pessoa, se isso realmente me acontecera, então eu não iria retroceder. É lógico que tudo estava morrendo, a partir daquele instante, o meu mundo, o mundo que eu fizera com tanto empenho, já ia começar a ficar para trás. Chegando em casa encontrei todos lá: Gilberto, Carmem Lúcia, Raul Oscar, Vera Lúcia, Gertrudes. Eles me olharam apreensivos e eu contei o que se passara. Também lhes disse que eles não precisavam mais se preocupar, pois daquele dia em diante eu voltaria a ser calma, sem eclosões. Choramos todos juntos.
"Todo mundo quer falar com Neiva e, apesar da inesgotável paciência dela não consegue atender a todos”.
Nisto entrou um casal com aspecto de roceiros e trazendo pela mão uma mocinha de quinze anos, magra e visivelmente doente. Nestor prestou atenção na “consulta” e ficou vivamente impressionado. A mocinha tinha agulhas, pregos e outras coisas de metal que “apareciam” no seu corpo e quanto mais tirava, mais aparecia. Neiva olhou, falou muito pouco, chamou um dos Avaganos que faziam papel de porteiros e mandou que fosse feito um trabalho no Templo.
Despachou os três afirmando que a mocinha iria ficar boa e que os objetos estranhos iriam parar de aparecer. Tão pronto saíram e Nestor perguntou: “Tia, a senhora acha que ela vai mesmo sarar?, e esses objetos, de onde vem?, como pode acontecer?”
Magnético animal, fluído, ectoplasma, carma pesado. É isso aí, Nestor. Onde quer que a moça passe os objetos metálicos de pouco peso são atraídos e penetram no seu corpo. Naturalmente existe uma falange de espíritos cobradores ajudando o fenômeno. Mas a base é a mesma de qualquer outro fenômeno ectoplasmático só que agravado. Se conseguirmos aliviar um pouco a carga do magnético ela vai melhorar, se também conseguirmos retirar os cobradores ela pode sarar. Se ela desenvolvesse a mediunidade seria uma grande Médium. Mas não sei, tudo depende do que eles irão fazer com ela depois que saírem daqui.
Mas a senhora viu as agulhas no corpo dela?.
Vi uma ou duas. Como disse o Mendonça há muito tempo atrás, eu tenho raios X nos olhos.
O Mendonça? Quem era ele?
Deixe que lhe conto. Certo dia chegou a minha casa a esposa do Mendonça, um dos engenheiros da Novacap e muito meu amigo. A mulher estava com um ar muito aflito e foi logo me dizendo:“Neiva, acho que estou com uma agulha enfiada aqui no braço esquerdo”; e me mostrou o braço que parecia realmente um pouco inchado.
Como?... disse eu. Você disse que tem uma agulha aí?
Sim,.. disse ela. Eu estava provando um velho vestido que estou fazendo, senti cansaço e me deitei um pouco e, sem querer por cima do vestido. Estranhamente adormeci, embora tivesse sentido a picada quando a agulha penetrou no braço. Acordei, continuei minhas tarefas e só fui pensar no assunto quando a dor, já de noite. Agora a dor já saiu do braço, está aqui, perto da clavícula e eu estou apavorada.
Olhei para o Mendonça e vi que ele também estava preocupado pois conhecia os casos que se contavam a esse respeito; diz-se que a agulha percorre o corpo todo e que quando atinge o coração a pessoa morre. O Mendonça era muito meu amigo. Eu costumava transportar o pessoal da topografia da Novacap e foi assim que nos conhecemos. Quando começaram as manifestações da minha clarividência o Mendonça me ajudou muito, principalmente em relação aos meus filhos. Ele sempre tinha uma palavra de carinho e dava um ar de seriedade onde todo mundo dava apenas palpites e ainda por cima negativos. Ele era espírita Kardecista e tinha a mente aberta. Mas o mais importante é que ele acreditava em mim.
“Tia, a senhora deve ter passado por muitas experiências desagradáveis, nesse tempo. Dá para a senhora dizer alguma coisa sobre isso?”
Espera Nestor, deixe acabar de contar a estória da agulha. Dei uma olhada na mulher e, mesmo por baixo da roupa, vi a agulha no peito dela, colocada superficialmente. Mostrei o local e eles se encaminharam imediatamente para o hospital.
Neiva, disse o Mendonça quando se despediram se cuide bem, você tem um raio X nos seus olhos. Mais tarde me trouxeram a notícia de que a agulha havia sido retirada sem maiores problemas. Com relação as minhas experiências desagradáveis, é verdade Nestor, elas foram muitas. Hoje eu compreendo a tudo e a todos. Mas naquele tempo, realmente as coisas me magoavam. Você pode imaginar. Nestor, eu voltando de um transe em que permaneci totalmente inconsciente, sentir dor no braço e ver que fui queimada com charuto aceso como teste?
Mas Tia, eu não entendo, porque haveriam de fazer testes com a senhora; não bastavam as provas que a senhora já dera, como, por exemplo, o caso da agulha?
Nestor, meu filho, para você entender o que se passava é preciso que saiba a posição do espiritismo aqui na Brasília da Cidade Livre. Havia alguns terreiros e alguns centros kardecistas e o meu caso, no princípio foi confundido com manifestações umbandistas. Não havia experiência alguma com a clarividência, nem mesmo aquela da parapsicologia que naquele tempo era ainda incipiente no País. Bem, Tia, acho que entendo, aliás, até hoje não creio que ela seja entendida.
Sim, Nestor, por aqueles que entram em contato comigo, ela é entendida. Mas você se lembra o que lhe disse no começo de nossas conversas: Não basta a minha clarividência para que o mundo entenda as nossas mensagens; é preciso todo nosso ritual, o colorido, as construções, as iniciações. Naquele tempo, Nestor, ainda havia o agravante da euforia da construção de Brasília, as pessoas aqui estavam na base de aventuras de ganhar dinheiro, de trabalhar, fazer comercio, mudar de vida e de ambiente. Tudo era mais ou menos improvisado, em barracos rústicos e clima de aventura. O espiritismo predominante refletia o ambiente. Eu acho que o Pai quis que fosse assim, para que eu não “nascesse” com vícios mediúnicos que seriam incompatíveis com a nossa missão. Por isso Nestor, você pode reparar que desde o começo as coisas que foram registradas, com as poucas coisas escritas, servem até hoje e todos os registros obedecem a uma linha harmoniosa, nunca tendo havido uma só contradição entre o que foi ensinado e o que está sendo ensinado.
Num certo sentido essas adversidades foram muito boas para mim. Muito cedo eu desisti de querer ser entendida pelos homens e me voltei para os amigos espirituais. Mas a própria missão exigia e eu tinha que me subordinar aos amigos encarnados circunstantes, o que, aliás, me ensinou as principais lições.
“Parece Tia, que através do que a senhora está me dizendo a gente pode entender um pouco do que acontece hoje com Médium principiante”
Pois é, meu filho, eu estava na maior confusão quando Mãe Neném apareceu. Ela era uma senhora, tipo da matrona, daquelas que inspiravam confiança, pela autoridade que exercia. O único problema era sua formação Kardecista que não aceitava Pretos Velhos nem Umbanda. Isso me trouxe maior insegurança. Sua primeira medida foi convocar um médium muito conceituado o qual chegou com muita autoridade, na condição de árbitro. Seu nome era Cisenando e tão logo ele se familiarizou comigo condenou as minhas maneiras bruscas de agir e não gostou de certas entidades que se manifestavam por mim.
“Neiva, dizia ele, vamos afastar essas entidades, é para o seu próprio bem, vamos fazer uma reparação para você não ficar louca e ir parar num hospício”.
Entre as “entidades” que ele pretendia afastar estava o Cacique Guerreiro Tupinambás. Fiquei muito triste quando soube que esse espírito iria subir e lembrei logo de falar com Mãe Yara. Entre as providências que Mãe Neném havia tomado para o meu desenvolvimento, estava a reserva de um canto da casa para os trabalhos espirituais. Dirigi-me para esse canto com a intenção de ouvir Mãe Yara e lá estavam Mãe Neném e o Cisenando. Tomei o maior susto pois percebi que não contavam com minha presença, e o pior é que o Cisenando estava incorporado e, para meu maior espanto, com Mãe Yara! E pela boca desse médium, ela dizia: “Os espíritos de pouco desenvolvimento espiritual, que entram neste mundo, permanecem nas proximidades da Terra, na atmosfera densa, na escuridão. Eles são chamados de espíritos sofredores e sua maior função é atrapalhar o trabalho missionário dos trabalhadores da última hora. Neném ensine Neiva a assimilar as suas visões. Faça com que ela retorne a sua segurança, para a grande obra que vocês duas terão que levantar".
A mente é o reflexo da alma, que é o nosso verdadeiro “eu”. Fez um silencio e continuou: Neném, esses espíritos são de umbanda, tenha todo cuidado. Se for possível volte para Goiânia. Saia depressa sem ser vista. Custei a acreditar no que acabara de ouvir. Meu Deus!, como podia ser, esse espírito que falava tão bem, que já ouvi tantas vezes como Dona Yara ou Mãe Yara e agora se dizia o Amigo de Sempre e falava tão mal, tão negativo, e ainda por cima criticando o Cacique Guerreiro Tupinambás que eu já estava gostando tanto. Na minha insegurança e falta de conhecimento doutrinário voltei a estaca zero. Minha revolta já não tinha limites, me virei contra todo mundo e não sabia para que lado me voltar. Comecei a incorporar sofredores e o pior, você sabe não é Nestor, e o pior era minha inconsciência.
“Sim, Tia, sei que a senhora é totalmente inconsciente e que tem até um pedido seu feito ao Pai para que nunca saiba o que saiu pela sua boca. Mas, me diga, além da senhora existem outros médiuns inconscientes?” Nestor, nesse ponto o Tumuchy é intransigente e afirma peremptoriamente que não existe inconsciência mediúnica além da minha. Eu não discordo dele mas não vou tão longe. Acredito que possa haver exceções, pois no mundo de relações entre o céu e a terra tudo é possível. Agora, realmente eu concordo com ele quando diz que o problema é biológico e não moral. De fato, o próprio mecanismo da responsabilidade humana, o ser humano considerado individualmente, não condiz com a inconsciência mediúnica. Em nosso quotidiano nós temos comprovado isso quando vemos até obsediados em fase de convulsões se desviarem de obstáculos, não se machucarem etc.
“Mas então Tia, desculpe desviá-la de sua estória que está muito bonita, mas então como ficamos nisso, qual a nossa atitude diante dos médiuns que dão comunicações e se dizem inconscientes?"
Nestor, antes de mais nada é preciso respeitar muito o médium de incorporação, o nosso Apará. Mas, realmente o que acontece é que o médium embora registre, ouça o que ele mesmo está falando, muitas vezes ele se alheia, procura não registrar, evita ser indiscreto, não quer se imiscuir na vida alheia, e acaba por realmente não se lembrar do que falou. Esse é o médium ideal, que segue o conselho de Pai Seta Branca de “comunicar sem participar”. Isso acontece principalmente com médiuns totalmente conscientes como, por exemplo, alguns que você conhece como o de Pai Nagô e Pai Zé Pedro. Bem Nestor, vê se não me interrompe. Tenho medo de não ter tempo de contar a minha história e sei que ela vai ajudar muito a vocês quando eu partir. Eu estava naquela fase triste e sem saber o que fazer, quando, um dia Mãe Yara chegou de mansinho e começou a falar no meu ouvido, e, tão logo eu a vi comecei a me desabafar. Como?! Disse eu, a senhora me disse tanta coisa bonita, me prometeu o céu e agora isso, até o Cacique Guerreiro que eu gosto tanto vocês querem afastar.
“Calma, calma, Neiva. Não se esqueça que na vida, quando você está esperando o céu, a terra esta esperando por você. Sim filha, antes de você subir ao Céu terá que baixar na Terra. Não queira que as pessoas pensem como você. Seja imparcial no seu raciocínio e nada aceite sem entender. Não se esqueça que ninguém possui a verdade total”.
Mas, Mãe Yara, diga alguma coisa sobre esse médium, diga alguma coisa sobre o que eu vi. “Neiva, respondeu ela, você não poderá caminhar sozinha. Dê trabalho aos seus braços. Leve o consolo enxugue as lágrimas dos aflitos, ajude a todos aqueles que caminham ao seu lado, não atrapalhe para não ficar sozinha. Fique neutra em relação aquele assunto e volte à normalidade.”
As palavras de Mãe Yara me fizeram refletir muito e passei uns poucos dias sem eclosões. Até que, certo dia, cheguei a casa e encontrei minha filha, Carmem Lúcia, com um dente inflamado e a boca muito inchada. Fiquei aflita e procurei logo tomar alguma providencia, porém naquele momento alguém me puxou para traz e eu incorporei. Atirei-me contra minha filha, descompondo-a e tentando machucá-la e não sei o que mais, pois perdi os sentidos. Quando voltei a mim e soube o que havia acontecido entrei novamente num terrível conflito. Desta vez a coisa tinha sido muito pior, eu havia atingido a minha filha, que era a razão de toda minha luta, minha vida, meus filhos eram como o sangue que corria nas minhas veias. Mas, na minha vergonha e no meu orgulho, eu, já consciente nos meus sentidos, comecei a maltratá-la ainda mais.
A situação ia ficar fora de controle novamente quando apareceu um casal de Pretos Velhos, Pai João e Mãe Tildes. Com um ar tranqüilo e seguro eles disseram: “Está tudo bem, minha filha, tudo bem, a sua filha Carmem Lúcia é a Marcinha, filha de Márcia, um bom espírito que está em grandes alturas. Mas ela está preocupada com o que está acontecendo aqui, principalmente com sua filha. A intenção dela é levar a menina consigo para os planos espirituais”.
Ao ouvir isso fui novamente tomada e me lancei contra Carmem Lúcia num gesto de obsediada. Estava muito incorporada, muito mesmo. Acordei, como se viesse de uma longa viagem. Custei a tomar pé da realidade e a primeira coisa que vi foi uma seringa de injeção na mão do Dr. Calado. Esse médico, desmentindo o seu nome, falava demais. Tornei a incorporar. Não sei quanto tempo fiquei apagada. Quando voltei novamente a Carmem Lúcia estava sentada no meu colo com ar de tranqüilidade e dizia:“Mãezinha, o espírito disse que veio me buscar. Depois veio outro espírito e me deu um passe e a dor foi passando”.
Ele não veio matá-la?, perguntei irritada. Pai João não deixou que eu continuasse.
“Basta, disse ele, você abusou demais. Puxe pela sua individualidade. Não é a primeira vez na Terra que você está sendo clarividente. A Mãe Yara, a senhora do Espaço não virá mais aqui devido ao seu desrespeito aos espíritos. Mas eu vim para lhe ensinar, eu e a Matildes. De hoje em diante seremos seus instrutores. Mas exijo muito respeito para com os espíritos, sejam de luz ou sofredores”.
Sofredores? Esses demônios que a igreja denuncia e condena? Dei uma gargalhada debochada. No mesmo instante recebi um impacto tão grande no rosto que comecei a chorar. É para sua felicidade, disse ele, se você continuar a cair no padrão dos espíritos sofredores, você poderá enlouquecer. Meu rosto estava pegando fogo. Senti tremenda raiva e fui dizendo, tenho ódio de espiritismo, como querem me obrigar a ser espírita?
“Filha, ninguém a está obrigando a ser espírita. Espiritismo é mediunidade e você tem todas as mediunidades, com exceção da olfativa; além disso você vem com a missão de desenvolver o Doutrinador, uma nova forma de mediunidade que vem com força cabalística, iniciática”.
Pai João parou de falar. Meu coração foi se acalmando. O calor do corpinho da Carmem Lúcia aconchegada no meu colo, me enchia de ternura. Beto, com a pequenina Vera Lúcia, a caçula, no colo foi chegando e me abraçou. Raulzinho sentou perto e Gertrudes perguntou se eu queria um copo de leite. Minha família, meus amores, minha vida! Olhei para o Pai João e Mãe Tildes e senti todo o amor que emanava dessas preciosas criaturas de Deus. Sim, agora eu sabia, eu sabia do meu rumo, do meu roteiro e da minha missão com o Doutrinador!
Nestor chegou zangado. As coisas no seu trabalho não tinham sido satisfatórias e ele recebeu uma carta de sua mãe pedindo para ele ir vê-la. Ele ama muito sua velha mãe, mas não gostava da vida na sua cidade natal. Colonizada por russos católicos a cidade refletia nitidamente os velhos hábitos comunitários e sua intransigência em relação às coisas espíritas. Ele tinha sido educado no seminário local e, para os olhos de certas pessoas era um herege. Também nesse dia ele chegou mais cedo que de costume e Neiva foi logo perguntando o que acontecera.
“Não é por nada, Tia. Eu gosto do meu pessoal e até admiro a capacidade deles de viver. Eu tenho um velho avô que com quase noventa anos ainda levanta às quatro da manhã e vai ordenhar as vacas. O velho é um barato, mas quando se trata de religião é completamente fechado e duro. Quando vou para lá eu fico feito um peixe fora d’água”.
É...,disse Neiva, eu conheci isso de perto. Não tanto pela religião em si, mas pela intransigência com os meus fenômenos, minha vida missionária e minha conduta. Mas a própria adversidade que me deparava me dava as lições que eu ia aprendendo. E cada dia eu ia me convencendo mais de que a fé é algo transcendental, é amor e é ternura. E eu tinha que cortejar e aprender esses valores com aqueles nos quais havia sido criada e educada. Valores da soberbia e da força dos velhos coronéis dos sertões nordestinos. Se dissesse a menor mentira ou mostrasse medo de dormir sozinha num quarto escuro era severamente castigada. Nesse meio havia pouco espaço para a imaginação e a gente era instada a só acreditar nas coisas que via ou palpava. E isso foi motivo de muitos conflitos. É meu caro Nestor Sabatovics, a missão caminha junto com o missionário.
Veja filho, depois dessa aonde eu fui parar. Meu mundo, o mundo meu e de meus filhos começou em 1950 quando eu era uma viúva recente e com apenas 29 anos de idade. Raul, meu marido, havia falecido em 1949 me deixando com quatro filhos: Gilberto com cinco anos, Carmem Lúcia quatro, Raul com dois e Vera Lúcia com apenas onze meses, além de Gertrudes com doze anos. Gertrudes era minha afilhada, mas tão apegada a mim que aproveitou uma confusão com sua certidão de nascimento e fez outra com meu sobrenome. A partir daí nos organizamos como perfeita célula familiar, pois sempre houve muito amor entre nós, muito carinho. A única dificuldade foi a de conciliar a independência que já sentia dentro de mim com a rígida determinação de meus pais, principalmente do velho Chaves meu pai.
Procurando a liberdade econômica como base para uma independência mais ampla, minha primeira experiência foi montar um “Studio” fotográfico, mesmo a contragosto de meu pai.
“E como foi sua carreira de fotógrafa?” Interrompeu Nestor. Foi breve. A vida confinada a um cômodo de 3x3 não estava sendo muito do meu agrado. Naquele tempo eu já começava a sentir ânsias de correr mundos, saber o que havia através daquelas montanhas. E foi assim que resolvi ser motorista profissional. Aproveitei de algumas poucas facilidades locais, juntei tudo que tinha, tirei carteira e comprei meu primeiro caminhão.
“E como era esse carro?”, perguntou de novo Nestor.
Era um Ford de cinco toneladas, 1946.
“Ah! , já sei, era um Cara de Sapo tipo queixo duro”.
Não Nestor meu caminhão não era “queixo duro” ele apenas não era sincronizado! Reagiu Neiva com um muxoxo. Daí, da Colônia Agrícola de Ceres, parti para o Brasil afora.
“E seus filhos, a senhora os deixou em Ceres?”
Coisa nenhuma! Ficamos todos juntos, ora na cabine do Ford, ora nalguma pensão de currutela, nossa vida era na estrada. Quando eu tinha alguma viagem mais longa eu alugava uma casa e Gertrudes cuidava de tudo até a minha volta. Minhas voltas eram sempre uma alegria renovada. Eu sempre trazia presentes, novidades e fazia umas comidinhas gostosas, pois era orgulhosa da minha capacidade culinária. E assim essa vida durou uns cinco ou seis anos. Conheci uma boa parte do Brasil de norte a sul e fiz muitos amigos, principalmente entre os caminhoneiros.
“E os amores?” Perguntou Nestor com ar complacente.
Nestor, por incrível que possa parecer, eu, apesar de ser viúva e bonita eu era respeitada e acatada mais pela minha capacidade profissional e camaradagem de colega do que como mulher. Realmente, Nestor, desde aquele tempo, o Pai já cuidava de mim e eu sentia intuitivamente o meu destino de missionária. Meus amores eram meus filhos e minha vida o lar mais ou menos móvel que mantínhamos. Assim, eu morei em Anápolis, São Paulo, Londrina e alguns outros lugares. Meu último pouso antes da Cidade Livre e da abertura da minha clarividência foi Goiânia. Gilberto já estava com onze anos e Carmem Lúcia com dez e eu tinha que pensar na escola deles. Aluguei uma casa nessa cidade onde eu tinha amigos, desde o tempo em que meu pai trabalhou na construção do Palácio das Esmeraldas, e eu sempre gostei de Goiânia. O jeito foi trabalhar na única empresa de ônibus que havia. Ela fazia uma linha de micro-ônibus entre Goiânia e Campinas e eu trabalhava um bocado. O sistema envolvia salário e comissão e tudo dependia do motorista em parar e ter paciência com os passageiros. Gilberto apesar dos onze anos já me ajudava como cobrador. Saíamos de nossa casa de madrugada, os dois numa bicicleta, e íamos apanhar o carro na garagem. À noite repetíamos o percurso. Quando as aulas começavam eu fazia o trabalho sozinha.
“E nesse tempo a senhora tinha vida religiosa?”
Não Nestor, mas já começavam a acontecer coisas estranhas, diferentes. Um dia, em 1958 cheguei do trabalho muito cansada. Deitei um pouco com a intenção de tomar um banho em seguida e fiquei olhando para o teto pensando na minha vida, nas coisas que tinha de fazer, quando comecei a ver no teto uma campina verde e um castelo, nas imediações do qual pessoas caminhavam e riam. Vi então mil coisas diferentes acontecendo e exclamei, meu Deus! Essa visão me preocupou muito e eu trabalhava pensando em voltar para casa, me deitar no mesmo lugar e ver o meu lindo castelo com as pessoas passeando e rindo. Até que um dia eu soube que aquele castelo existia numa das sete dimensões que antecedem o Canal Vermelho. Como conseqüência eu teria uma grande caminhada cármica para chegar até lá e me inteirar das coisas com segurança. Mas a vida não parava para mim, sempre com alguma novidade, alguma doutrina.
“E como foi sua carreira de fotógrafa?” Interrompeu Nestor. Foi breve. A vida confinada a um cômodo de 3x3 não estava sendo muito do meu agrado. Naquele tempo eu já começava a sentir ânsias de correr mundos, saber o que havia através daquelas montanhas. E foi assim que resolvi ser motorista profissional. Aproveitei de algumas poucas facilidades locais, juntei tudo que tinha, tirei carteira e comprei meu primeiro caminhão.
“E como era esse carro?”, perguntou de novo Nestor.
Era um Ford de cinco toneladas, 1946.
“Ah! , já sei, era um Cara de Sapo tipo queixo duro”.
Não Nestor meu caminhão não era “queixo duro” ele apenas não era sincronizado! Reagiu Neiva com um muxoxo. Daí, da Colônia Agrícola de Ceres, parti para o Brasil afora.
“E seus filhos, a senhora os deixou em Ceres?”
Coisa nenhuma! Ficamos todos juntos, ora na cabine do Ford, ora nalguma pensão de currutela, nossa vida era na estrada. Quando eu tinha alguma viagem mais longa eu alugava uma casa e Gertrudes cuidava de tudo até a minha volta. Minhas voltas eram sempre uma alegria renovada. Eu sempre trazia presentes, novidades e fazia umas comidinhas gostosas, pois era orgulhosa da minha capacidade culinária. E assim essa vida durou uns cinco ou seis anos. Conheci uma boa parte do Brasil de norte a sul e fiz muitos amigos, principalmente entre os caminhoneiros.
“E os amores?” Perguntou Nestor com ar complacente.
Nestor, por incrível que possa parecer, eu, apesar de ser viúva e bonita eu era respeitada e acatada mais pela minha capacidade profissional e camaradagem de colega do que como mulher. Realmente, Nestor, desde aquele tempo, o Pai já cuidava de mim e eu sentia intuitivamente o meu destino de missionária. Meus amores eram meus filhos e minha vida o lar mais ou menos móvel que mantínhamos. Assim, eu morei em Anápolis, São Paulo, Londrina e alguns outros lugares. Meu último pouso antes da Cidade Livre e da abertura da minha clarividência foi Goiânia. Gilberto já estava com onze anos e Carmem Lúcia com dez e eu tinha que pensar na escola deles. Aluguei uma casa nessa cidade onde eu tinha amigos, desde o tempo em que meu pai trabalhou na construção do Palácio das Esmeraldas, e eu sempre gostei de Goiânia. O jeito foi trabalhar na única empresa de ônibus que havia. Ela fazia uma linha de micro-ônibus entre Goiânia e Campinas e eu trabalhava um bocado. O sistema envolvia salário e comissão e tudo dependia do motorista em parar e ter paciência com os passageiros. Gilberto apesar dos onze anos já me ajudava como cobrador. Saíamos de nossa casa de madrugada, os dois numa bicicleta, e íamos apanhar o carro na garagem. À noite repetíamos o percurso. Quando as aulas começavam eu fazia o trabalho sozinha.
“E nesse tempo a senhora tinha vida religiosa?”
Não Nestor, mas já começavam a acontecer coisas estranhas, diferentes. Um dia, em 1958 cheguei do trabalho muito cansada. Deitei um pouco com a intenção de tomar um banho em seguida e fiquei olhando para o teto pensando na minha vida, nas coisas que tinha de fazer, quando comecei a ver no teto uma campina verde e um castelo, nas imediações do qual pessoas caminhavam e riam. Vi então mil coisas diferentes acontecendo e exclamei, meu Deus! Essa visão me preocupou muito e eu trabalhava pensando em voltar para casa, me deitar no mesmo lugar e ver o meu lindo castelo com as pessoas passeando e rindo. Até que um dia eu soube que aquele castelo existia numa das sete dimensões que antecedem o Canal Vermelho. Como conseqüência eu teria uma grande caminhada cármica para chegar até lá e me inteirar das coisas com segurança. Mas a vida não parava para mim, sempre com alguma novidade, alguma doutrina.
A partir de então comecei a analisar o desenrolar da vida dos homens, partindo de nova compreensão. A partir dessa observação tudo mudou em minha conduta natural. Continuava a ver castelo e as coisas que ali aconteciam me enchiam de cuidados. Minha vontade era de penetrar nele e na sua intimidade. Porém eu tinha a impressão que com isso estaria penetrando na vida de meus filhos, o que sentia ser um desrespeito e não entendia bem o meu procedimento. Noutra ocasião eu fui contratada para uma viagem grande que me daria ganhos para atender algumas necessidades prementes, pois eu já estava tendo dificuldades financeiras. A viagem era para as imediações de Luziânia em Goiás. Fui buscar a carga e, enquanto os ajudantes carregavam o caminhão eu fiquei sentada na calçada, entretida com as pessoas que sempre me olhavam com certa curiosidade e sempre queriam me conhecer. Eu já estava acostumada com isso, sempre queriam conhecer a motorista profissional. De repente eu vi um jovem que entrou como que se disfarçando no meio das pessoas que me rodeavam. Notei que eu já o tinha visto no castelo e senti o coração bater com força! No mesmo instante, porém vi que um soldado da polícia iria prendê-lo. Rápido, sem pensar, procurei atrair a atenção do soldado e fazia sinais para o rapazinho que fugisse ele me entendeu. O soldado ficou perto de mim fazendo mil e uma perguntas, que eu respondia com muito cuidado.
“Neiva, viva a sua vida interior com mais intensidade, Deus está sempre dentro de você. Comece a trabalhar com amor em benefício dos outros”. Era Mãe Yara, a Senhora do Espaço e eu lhe disse: tenho medo do soldado, do que ele deve ter pensado quando eu chamei sua atenção no meio de tantas pessoas.
“Filha, disse ela, não tenha prevenções contra os seus semelhantes, desperte para a vida, medite sobre as suas responsabilidades perante a humanidade e perante Deus. De você, vão depender muitas criaturas que servem na família, no trabalho e na sociedade. A ação do tempo é infalível e ele nos guia suavemente pelo caminho certo, aliviando as nossas dores, assim como a brisa leve abranda o calor do verão. Cada pessoa emite a sua própria vibração. O que se pede, sobre tudo, filha, é o esforço mental de compreender”.
Meu Deus! Eu já começava a chegar, a entender. Pensei, porque não perguntei a Mãe Yara sobre o castelo? Mesmo assim a resposta veio.
“Filha, o missionário tem uma criação especial e a sua aura dá uma condição especial de vida à sua família. Na verdade são tribos, e de época em época descem para a Terra, espíritos como você, que estão a caminho de Deus. São tribos que já fizeram muito aqui, isto é, tribos que passaram, construíram e deixaram muitas invenções, mas que não souberam amar”.
Como? Perguntei se são tribos que já morreram.
“As forças são recebidas por meio do cérebro e fazem as impressões na mente por ondas de pensamento, ondas essas que podem ser medidas e gravadas como as ondas do som. E é a capacidade de emitir as ondas mentais aos planos superiores que nos dá o poder de fazer as coisas que parecem milagres. Existem aqueles que não compreendem as forças do poder superior. Mas não dê ouvidos às intrigas e às calúnias; só as árvores que dão bons frutos é que são apedrejadas por aqueles que não alcançam esses frutos. A árvore que não dá frutos, ninguém se importa com ela”.
E, sorrindo, se foi. Eu quis ficar frustrada, mas pensei: Meus filhos estão comigo e eu sempre os protegi e continuarei a protegê-los.
Sempre foi assim e não serei eu quem vai mudar o curso das coisas. Sim, Nestor, os conflitos aumentavam e eu me debatia só, muito só. Às vezes eu procurava algum espírita, mas, invariavelmente ele me citava algum exemplo como se Alan Kardec fosse vivo e segurasse toda a evolução do mundo dos espíritos. Os contatos foram rareando e eles acabaram por se desligar de mim. Somente Chico Xavier, de longe, me dava crédito. Eu me sentia uma pobre louca, solitária e insegura nos meus pensamentos; o pior era que eu dava explicações, esclarecendo as coisas que via. Deus aceitara o juramento dos meus olhos, quando os entreguei a Jesus. Sim, meu filho, isso tudo se passou em 1958 e as coisas lembradas me trouxeram até aqui. “Seja verdadeira em tudo, dizia Mãe Yara, deixe que a doutrina em sua ação infalível nos guie suavemente no caminho certo, aliviando as nossas dores. Filha, Deus se manifesta ao homem através do próprio homem e vive a sua figura simples e hieroglífica, sim, filha, essas são palavras dos antigos”.
As palavras de Mãe Yara ficaram gravadas na minha cabeça, mas longe do meu coração.
Certa ocasião cheguei em casa mais ou menos a meia noite e estava com muita fome. Peguei uma panelinha para esquentar um ovo e, meio desajeitada, queimei um dedo; cai no meu baixo padrão e, meu Deus! Mãe Yara estava perto e ouviu.
“Filha, disse ela, que vergonha! Pensar que esperamos que você seja uma líder espiritual. Vim para fazer uma prece contigo. O seu Manuel das Emas, o seu amigo, vai morrer. Na sua próxima viagem mande o Delei com a turma”.
Não lembro se comi o ovo, lembro apenas que estava insegura. Perguntei ao Getúlio sobre o que ele sabia a respeito do seu Manuel e ele, ao par da minha situação disse que eu tivesse cuidado e me acalmasse, pois existiam espíritos zombeteiros e poderia ser alguma interferência. Senti-me inquieta e, pior, eu sabia que não era verdade aquilo que ele havia dito. E continuei pensando naquelas ofensas; e se ela não voltasse mais? Na hora do almoço o Delei pediu a chave do caminhão e foi fazer o serviço para me descansar. Eu esqueci completamente do aviso de Mãe Yara. Mais tarde eu soube que o seu Manuel caíra morto. Pensei: quem sabe se eu estivesse rezado com a Senhora do Espaço, como ela quisera na noite anterior, eu tivesse ajudado o seu Manuel? Tudo passou. Oito dias depois, vi a noite, com os meus olhos abertos, o seu Manuel das Emas, de pé em uma estrada luminosa e amarela, com seu chapéu de palha e com a mesma roupinha que ele sempre usava. Ele deu a entender que continuava a ser meu amigo e sorria, como se me dissesse:”estou feliz”. Sim Nestor, assim fui tendo visões.
“Neiva, viva a sua vida interior com mais intensidade, Deus está sempre dentro de você. Comece a trabalhar com amor em benefício dos outros”. Era Mãe Yara, a Senhora do Espaço e eu lhe disse: tenho medo do soldado, do que ele deve ter pensado quando eu chamei sua atenção no meio de tantas pessoas.
“Filha, disse ela, não tenha prevenções contra os seus semelhantes, desperte para a vida, medite sobre as suas responsabilidades perante a humanidade e perante Deus. De você, vão depender muitas criaturas que servem na família, no trabalho e na sociedade. A ação do tempo é infalível e ele nos guia suavemente pelo caminho certo, aliviando as nossas dores, assim como a brisa leve abranda o calor do verão. Cada pessoa emite a sua própria vibração. O que se pede, sobre tudo, filha, é o esforço mental de compreender”.
Meu Deus! Eu já começava a chegar, a entender. Pensei, porque não perguntei a Mãe Yara sobre o castelo? Mesmo assim a resposta veio.
“Filha, o missionário tem uma criação especial e a sua aura dá uma condição especial de vida à sua família. Na verdade são tribos, e de época em época descem para a Terra, espíritos como você, que estão a caminho de Deus. São tribos que já fizeram muito aqui, isto é, tribos que passaram, construíram e deixaram muitas invenções, mas que não souberam amar”.
Como? Perguntei se são tribos que já morreram.
“As forças são recebidas por meio do cérebro e fazem as impressões na mente por ondas de pensamento, ondas essas que podem ser medidas e gravadas como as ondas do som. E é a capacidade de emitir as ondas mentais aos planos superiores que nos dá o poder de fazer as coisas que parecem milagres. Existem aqueles que não compreendem as forças do poder superior. Mas não dê ouvidos às intrigas e às calúnias; só as árvores que dão bons frutos é que são apedrejadas por aqueles que não alcançam esses frutos. A árvore que não dá frutos, ninguém se importa com ela”.
E, sorrindo, se foi. Eu quis ficar frustrada, mas pensei: Meus filhos estão comigo e eu sempre os protegi e continuarei a protegê-los.
Sempre foi assim e não serei eu quem vai mudar o curso das coisas. Sim, Nestor, os conflitos aumentavam e eu me debatia só, muito só. Às vezes eu procurava algum espírita, mas, invariavelmente ele me citava algum exemplo como se Alan Kardec fosse vivo e segurasse toda a evolução do mundo dos espíritos. Os contatos foram rareando e eles acabaram por se desligar de mim. Somente Chico Xavier, de longe, me dava crédito. Eu me sentia uma pobre louca, solitária e insegura nos meus pensamentos; o pior era que eu dava explicações, esclarecendo as coisas que via. Deus aceitara o juramento dos meus olhos, quando os entreguei a Jesus. Sim, meu filho, isso tudo se passou em 1958 e as coisas lembradas me trouxeram até aqui. “Seja verdadeira em tudo, dizia Mãe Yara, deixe que a doutrina em sua ação infalível nos guie suavemente no caminho certo, aliviando as nossas dores. Filha, Deus se manifesta ao homem através do próprio homem e vive a sua figura simples e hieroglífica, sim, filha, essas são palavras dos antigos”.
As palavras de Mãe Yara ficaram gravadas na minha cabeça, mas longe do meu coração.
Certa ocasião cheguei em casa mais ou menos a meia noite e estava com muita fome. Peguei uma panelinha para esquentar um ovo e, meio desajeitada, queimei um dedo; cai no meu baixo padrão e, meu Deus! Mãe Yara estava perto e ouviu.
“Filha, disse ela, que vergonha! Pensar que esperamos que você seja uma líder espiritual. Vim para fazer uma prece contigo. O seu Manuel das Emas, o seu amigo, vai morrer. Na sua próxima viagem mande o Delei com a turma”.
Não lembro se comi o ovo, lembro apenas que estava insegura. Perguntei ao Getúlio sobre o que ele sabia a respeito do seu Manuel e ele, ao par da minha situação disse que eu tivesse cuidado e me acalmasse, pois existiam espíritos zombeteiros e poderia ser alguma interferência. Senti-me inquieta e, pior, eu sabia que não era verdade aquilo que ele havia dito. E continuei pensando naquelas ofensas; e se ela não voltasse mais? Na hora do almoço o Delei pediu a chave do caminhão e foi fazer o serviço para me descansar. Eu esqueci completamente do aviso de Mãe Yara. Mais tarde eu soube que o seu Manuel caíra morto. Pensei: quem sabe se eu estivesse rezado com a Senhora do Espaço, como ela quisera na noite anterior, eu tivesse ajudado o seu Manuel? Tudo passou. Oito dias depois, vi a noite, com os meus olhos abertos, o seu Manuel das Emas, de pé em uma estrada luminosa e amarela, com seu chapéu de palha e com a mesma roupinha que ele sempre usava. Ele deu a entender que continuava a ser meu amigo e sorria, como se me dissesse:”estou feliz”. Sim Nestor, assim fui tendo visões.
Ele está caduco, mais do que eu trabalho? Logo em seguida, porém me lembrei que ele já tinha morrido, e que por ocasião de sua morte se descobriu que tinha até casa de aluguel. Era um espírito de luz. Fiquei toda irradiada e sai correndo da cama. O encontro realmente me abalara. Mas compreendi que tudo estava acontecendo conforme Mãe Yara previra. Sabe Nestor, a nossa vida de hoje traz muitas recordações de meus primeiros tempos. Outro dia eu estava conversando com o Pedro Izídio, o Mestre Adjunto do Ministro Muyatã. Conversávamos com animação você sabe não é Nestor, como esses jovens me trouxeram tantas realizações. Falávamos sobre seus componentes quando entraram algumas pessoas carregando uma jovem desmaiada. Era realmente um quadro triste e Pedro imediatamente se dispôs a atendê-la, procurando poupar-me do trabalho. Isso fez com que eu me lembrasse do meu primeiro desdobramento, vinte e quatro anos antes e para que eu estava servindo. Hoje tudo estava ali, na segurança dos Mestres. Vejo como se fosse hoje a minha primeira viagem de desdobramento. Naquela tarde eu estava preocupada com meu caderno de contas. Afinal, eu tinha dois caminhões fichados na Novacap e estava um pouco assustada com as contas. Nas anotações estavam faltando muitas viagens, que eu havia feito e eu não atinava qual a razão dessa omissão. Tudo estava sendo feito à minha revelia. Sofri muito com isso com medo daquelas primeiras falhas na vida prática. Com dor no coração vi logo que eu não sustentaria aquela vida dupla; teria que optar entre a vida espiritual e a vida material. Pensava, tenho que descobrir um jeito. Estava assim, nesse desânimo, quando ouvi a voz de Mãe Yara: “Você filha, descobrirá tudo através dos seus próprios recursos”.
Deitei-me, no mesmo sofá onde estava examinando as contas, totalmente consciente, sentindo, porém as vibrações aumentarem e diminuírem. De repente fui arrancada do corpo e senti que era um movimento do mundo extra-sensorial e no entanto, eu me assustara como se fosse morrer. Senti-me desprendendo do corpo físico e que minha cabeça rodava. Percebi que algo me segurava; apesar de minhas faltas para com ela Mãe Yara era a minha salvação.
Rodei, não sei por quanto tempo. Subitamente, como por encanto, me vi diante de uma grande luz opaca e que não iluminava as imediações; dentro dela estava tudo claro, mas em sua volta só havia escuridão.
Ouvi alguém dizendo: “Faculdade mediúnica de transporte em desdobramento”. “Sim, responderam desdobramento”.
Eu pensava comigo: desta vez foi diferente, me arrancaram os bofes. Comecei a sentir ânsia, muita ânsia, mas vi quando chegaram dois senhores com aspecto de médicos e isso me acalmou. Comecei a ter linda visão, porém nada ouvia. Transporte em desdobramento. Comecei a me acalmar e percebi árvores que “caminhavam” e meio assustada, me voltei para Mãe Yara apontando para as árvores. Ela colocou a mão sobre a minha testa e disse: “Não tem árvores, olhei!”
E realmente não tinha árvores. Fiz outras perguntas e ela me respondia sempre. Comecei a pensar e percebi que ela me ouvia pela expressão do meu pensamento. A partir daí continuei fazendo assim com todos que encontrava: “ouvi” e era “ouvida”. Senti que era a primeira experiência e não estava sendo tão fácil, conforme eu “ouvi” comentarem. E assim, tive minha grande e nova experiência. Mais ou menos naqueles dias, digo naqueles dias porque eu ainda permanecia com aquelas sensações daquele “transporte de desdobramento”. Eram cinco horas da manhã, quando Pai João de Enoque veio me avisar para que eu não fosse trabalhar. Dei o meu carro ao Delei e fiquei em casa. Mais tarde Pai João me disse para comer pouco no almoço e nada a tarde, dizendo: ”Você terá um lindo trabalho a fazer”.
Mais tarde, incorporando no meu aparelho deu instruções a Mãe Neném para que eu me deitasse e ela formasse um pequeno grupo de pessoas mais íntimas. Quando chegou sete horas da noite, comecei a sentir as mesmas sensações da vez anterior, de transporte em desdobramento, e o procedimento foi o mesmo. Mas, em vez de me achar num lugar, como anteriormente, me vi numa espécie de veículo que “senti” ser uma nave etérica. Em seguida me vi num lugar especial da nave, “deitada em pé”, sim, porque a “cama” era como que presa nas minhas costas. Nisto ouvi uma voz com autoridade de comando: “Dezenove horas; não podemos evitar o incêndio do hotel”.
No meu corpo, meu aparelho vocal repetia as mesmas palavras, e Mãe Neném anotava. Outra voz dizia: “As vinte e uma horas haverá um grande incêndio. Como? Iremos esperar? Porque já são dezenove horas e meia”.
Eu não tenho condições de descrever as sensações que eu sentia, e pensava comigo mesma, será que tudo isto é verdade? Uma chama enorme surgiu de repente, interrompendo meus pensamentos. Mas tanto meus pensamentos como as coisas que eu estava cogitando eram verbalizadas pela minha fala no corpo, de forma que as pessoas que se achavam em torno de meu corpo a tudo acompanhavam. As chamas agora eram imensas. Eu me sentia mal e daria tudo para não estar envolvida em tão terríveis irrealidades. Mas independente de eu querer ali estava, naquele imenso aparelho. De repente notei algo diferente: Mais ou menos a uns dois metros de onde me achava vi um homem deitado.
Sua barba era cerrada, e o que mais me assombrou foi à constatação de que o seu corpo era pesado, não como o meu, era um homem de carne e osso. Nisso ouvi a voz de um dos comandantes dizendo: “Esse é o porteiro do hotel, vão sentir falta dele”.
Senti a nave se movimentar e parar em seguida em cima de imenso conjunto de casas. Eu estava “deitada” bem junto a uma enorme janela e dava para ver tudo muito bem. Fora dela que eu vira o incêndio. E do mesmo lugar dava pra ver e ouvir tudo que se passava dentro da nave. E eu sabia também que tanto eu, como o porteiro do hotel incendiado, estávamos em missão para evitar uma terrível epidemia. Não sei como voltei. Só sei que me vi sentada na cama e todos me olhavam com os olhos arregalados. Senti vontade de fazer um desafio e fui logo dizendo que tudo não passara de tolice dos espíritos. Foi só dizer isso e Pai João veio como um raio, mandando-me respeitar o ambiente, pois poderia perder a voz. Nisso alguém aumentou o volume do rádio que estava ouvindo e se ouviu claramente a notícia extraordinária: de São Paulo estavam informando que estava havendo um enorme incêndio em um hotel muito alto, mas que, por um estranho fenômeno, todos os hóspedes tinham sido salvos, exceto o porteiro que se achava desaparecido. Até àquela hora não tinham achado o seu cadáver, mas todos afirmavam claramente tê-lo visto antes do incêndio.
Depois, nos dias subsequentes, o noticiário confirmou; o porteiro desaparecera! Olhei ao meu redor. Todos liam as anotações no caderno de Mãe Neném. Pensava: como será?, darão falta do porteiro?, para onde irão levá-lo?, para algum outro planeta? De repente me lembrei de meus filhos. Oh! Meu Deus! Meus filhinhos, sem mãe e sem pai. Nove horas da noite e eu estava fora de casa desde as seis da tarde! No dia seguinte eu acordei com um grande mal estar e custei muito a me recuperar. Não quis ouvir falar sobre o assunto, porém o povo insistia em falar no incêndio e no fenômeno. Hoje Nestor, eu vejo a diferença entre a sua mediunidade a minha e vejo quanta caridade podemos fazer, quanto amor, que grande missão é a nossa. Já era de madrugada. Todos foram se retirando pensativos.
Nesse dia Neiva se retirou mais cedo do Templo. Nestor a acompanhou até o “sétimo” e não sentia vontade de se retirar, apesar de cansado. Ele estava impressionado com o tom profético de Neiva naquele encontro casual da “sala do café”. Neiva que também demonstrava cansaço percebeu a avidez do Jaguar e começou com voz tênue: é filho, observando aquele grupo de jovens, fiz uma análise deles junto a mim e voltei a 1959. A vida espiritual de então, a mansão dos meninos. Agora a mansão cultural dos instrutores, as ninfas, os trinos e enfim a mansão do médium iniciado em Dharma Oxinto. Lembro-me que só via a mansão, o castelo dos meninos quando eu estava mais cansada e deitada no meu sofá. Em resumo, eu pagava um preço para ter aquela proteção para os meus filhos; hoje eu pago também um preço alto para a cultura dos novos filhos e fico feliz. Entendo o porquê da facilidade com que ele aceita os conhecimentos. Vejo que o Jaguar entra na vida etérica, vai à sua mansão cultural e, quando soa a minha mensagem no plano físico já encontra a sua mente clara. Vejo também que o homem correto é esclarecido por Deus junto à presença Divina, o Prana. As religiões estão confundindo o homem e tirando o seu respeito para com Deus. Sim, meu filho Nestor, naquele tempo eu vivia fazendo comparações e muitas conjecturas naquele labirinto que ficou para traz. Certo dia eu estava preocupada porque há muito não tinha notícias dos meus colegas. Às sete horas da manhã ouvimos o ronco do motor Mercedes grande que se encostava à minha porta. Saímos todos para fora. Era o Nelson, um velho amigo com o qual eu me afinava muito. Fiquei muito satisfeita com aquela visita. Nelson falou muito, sem parar, e seu tema principal era me tirar de Brasília. Dizia que me daria um caminhão novo e que onde eu estava não servia para mim etc. Enquanto ele falava um espírito se colocou atrás dele e começou a fazer gestos mímicos e eu disparei a rir. Nelson estranhou o meu jeito e começou a me olhar com ar compungido, sem entender o meu drama. O espírito começou a “plantar bananeiras” e dar chutes nas costas de Nelson. Eu falei com o espírito, ao mesmo tempo em que eu falava com o meu colega e ele começou a se sentir confuso.
Saímos da porta e o espírito, para meu alívio, ficou e tudo começou a correr bem. Quando voltamos o espírito estava em pé na porta e tudo começou de novo. Eu ria muito, não conseguia me conter Nelson não quis jantar e começou a falar em ir embora. Já não falava mais em me levar dali como dizia no começo, quando chegará. Como foi triste a sua saída! Gilberto, meu filho, dizia: “Não, mamãe não deve ir, ela aqui trabalha perto de nós”.
Sim, eu sei, disse Nelson, é melhor você ficar Neiva, você já está se acostumando aqui. Nesse momento o espírito deu um pulo, fazendo novas mímicas e piruetas e eu disparei a rir enquanto Nelson se despedia dos que ali estavam. Neiva, disse ele, procure um especialista. Você toda a vida só trabalhou. Só pensávamos em você montada num caminhão. Procure um descanso, doze anos sem parar de trabalhar é muita coisa. Como parar?, respondi, e as crianças? Nelson foi embora e eu fiquei com mais uma frustração. A partir daí comecei a sentir mais na carne a minha prisão. Hoje, meu filho, eu compreendo como foi difícil a minha vida. Nessa época havia um colega que morava comigo, chamava-se Getúlio. Ele sofria muito com os problemas que eu estava enfrentando. E por isso eu cada dia me apegava mais a ele. Contudo, nosso relacionamento não passava de uma grande dívida transcendental. Não tínhamos uma vida conjugal normal; éramos dois jovens tocados por uma missão. Não nos amávamos, porém nos respeitávamos mutuamente. Ele tinha suas esperanças e eu tinha as minhas. Esperanças de novos encontros ou de casamento. Eu com quem já me esperava. E minhas esperanças não morriam apesar de tudo. Pois é meu filho, em 1958 eu já tinha todo esse acervo dentro de mim. Mas pedia aos espíritos que as coisas não acontecessem. E com toda essa insegurança que eu vivia, eu continuava a trabalhar na Novacap. Tinha sempre dois caminhões. Naqueles dias aconteceram muitos fenômenos comigo. Esse que eu vou contar é do tipo dos que passam desapercebidos pela gente.
Eu passara a noite em claro, devido às aparições e as coisas que eu participava. Pela manhã fui trabalhar no Cota Mil, nas imediações do Lago Paranoá. Os engenheiros desceram do caminhão e foram para suas tarefas. Enquanto esperava tentei colocar meus pensamentos em ordem. Procurei a garrafa térmica tomei um café e, como de costume quis fumar um cigarro. Eu tinha um isqueiro em forma de revolver, creio que um Mauser,Pai João dizendo: “Malcriada! Devia deixá-la sem o seu cigarro. Filha, continuou, procure acompanhar os espíritos, não deixe que eles percam tempo com você e com mesquinharias. Um dia, quando for uma rainha, sentirás vergonha!"
Pensei comigo: quanta coisa por um simples cigarro. Foi à conta de eu terminar o meu pensamento e o isqueiro foi arrancado da minha mão, batendo com força no para brisas, quebrando o vidro e voltando a cair na minha mão! Olhei o isqueiro e percebi que estava sem o parafuzinho e sem a tampinha. Fiquei apavorada. Estaria eu tão nervosa a ponto de fazer tudo aquilo? Procurei a tampinha, mas não encontrei. Quando de volta, cheguei a casa o Beto disse: Mamãe, olhe, é a tampinha do seu isqueiro. Tive um susto muito grande e contei a ele tudo que tinha acontecido, inclusive o vidro quebrado. Fui então avisar o seu Jaime que precisava ir a Goiânia comprar outro vidro, antes que acabasse de esfarelar. Ele foi olhar o carro e voltou dizendo que não viu vidro quebrado. Fui conferir e realmente, o para brisas não estava quebrado! Foi então que voltou a voz de Pai João: “Lição de luz e de amor. Eu não iria dar prejuízo a você”.
Salve Deus! Perguntei ao Betinho: ouviu o que o Nego Velho disse?
“Não, cadê ele”?
Ficou por isso mesmo, Salve Deus! Passaram muitos dias sem novidades, até que chegou uma menina com uma linda rosa vermelha.
Estávamos em meados de 1959. A menina entregou-me a rosa dizendo: “Meu pai mandou para a senhora”.
Para mim? O seu pai mandou? Essas tentativas de conquista eram comuns, aconteciam muitas vezes. Porém, nunca um pai, utilizando a própria filha. A menina tagarelava: São as primeiras rosas do canteiro do meu pai. Não, disse de repente, foi aquele moço do caminhão quem mandou, e apontou para uma Scania Vabis. Eu olhei na direção apontada e o motorista me deu um adeus com a mão e foi saindo. Era o Nelson.
Ele não tivera coragem de me ver louca, nunca mais. Segurei a rosa, e tive a maior surpresa, fiquei com a mão cheia de sangue! Dei um grito e joguei a rosa longe. Olhei novamente para a mão e não tinha mais nada. Apanhei a rosa novamente e nada. Porém não mais me lembrei da partida triste e nem do Nelson. Pensava agora somente no fenômeno que acabava de ver. Pensava naquela rosa. Sabe Nestor, fenômenos daqueles foram muitos. Até o dia em que Mãe Yara me disse que eu era médium de efeitos físicos e disse ainda: “A sua dor foi tanta que refletiu pelo fenômeno. Deus se compadeceu de você. Aquela tinta vermelha, da cor da rosa, cor de sangue ou outra cor, não importa se chama “Charme Cósmico”. A partir daquele instante você ficou preparada, iniciada, para efeitos de objetos”.
Perguntei: de onde e vinha tão rapidamente? “Não filha, existem depósitos do Pronto Socorro Universal”.
O homem tem o seu livre arbítrio, é verdade, porém há horas em que temos que segurá-lo, para não cair em certos abismos. Charme, herança transcendental, não sei, disse eu. Queria saber somente do sangue na minha mão. Ela sorriu com tal ternura que eu fiquei satisfeita. Desde então o fenômeno da rosa nunca apareceu. Sempre que eu via uma pessoa sofrida por uma situação sentimental, eu me lembrava daquela tardezinha, e da rosa. O fato é, que partindo daquele fenômeno, tudo era aproveitado. Coisas ricas em Deus Pai Todo Poderoso. Esse fenômeno só a nós é possível fazer, quando não há laços cármicos. Sim, porque ninguém penetra na seara de um caminho cármico. Só Deus Pai poderá interceder.
Veja filho. Uma senhora de bons costumes veio pedir que olhasse o noivo de sua filha. As duas ali estavam na minha frente e com um ar de expectativa. A senhora queria saber se ela faria um grande casamento com Rafael, esse era o nome do noivo, que morava no Rio e que, no momento estava no apartamento dela. Mentalizei, como sempre faço, e, qual não foi o meu espanto! Pedi então que elas mentalizassem o noivo, novamente, e sim, era ele, eu tinha certeza: eu o vi carregando tudo que havia no apartamento! Olhando para a senhora eu disse: Dona, ele é um assaltante! Virando-me para a moça eu continuei: não o queira filha, você vai ter um terrível susto. As duas se levantaram enquanto a moça dizia: “Louca, ela é louca, vamos mamãe, vamos”.
Desapontadas, elas se foram. Eu, sem saber na ocasião, o que elas haviam dito, fui trabalhar nos tronos. Depois me senti doente e fui para casa, pedindo ao meu bendito “fenômeno” que me dissesse algo. Passaram-se mais ou menos três dias quando me avisaram que havia duas senhoras que me queriam ver. Fui atendê-las. Eram elas. Uma delas ria e a outra, a moça, chorava. A mãe dizia: Viemos para Brasília, para a casa do meu filho. Estamos com medo. Foi tudo como à senhora disse. Ele levou tudo e ficamos com medo que ele voltasse e nos encontrasse lá. Salve Deus! Pensei comigo mesma, mais um fenômeno da rosa! Na consulta anterior eu vira que elas seriam mortas pelo “noivo”. Puxei com todo amor as forças dos mundos encantados dos Himalaias e pedi à minha flor, a minha rosa; o noivo assaltante iria esperá-las no apartamento para fazer melhor saque, mas, ele teve pressa e levou tudo que podia, logo.
Eu então marchei para junto do casal gritando: parem com isso gente! A mulher apontou o dedo para o meu rosto passando o braço tão rápido que quase me pegou, enquanto que o homem, apontando para mim, dizia: Sai daqui sua intrometida, não vê que a briga é por sua causa, infeliz! Vá cuidar da sua vida. Desaforo! Ia eu dizendo, quando a turma do deixa disso me tirou dali. Enquanto isso o homem continuava a esbravejar contra mim, dizendo coisas sem nexo como: fala-se no diabo e aparece o rabo. Meu pessoal apressou o carregamento, colocaram-se na cabine e eu fui parar no outro lado da cidade, com uma vontade muito grande de chorar. Porém Gilberto e Raul estavam comigo, éramos os três chefes da casa e eu não podia fraquejar. Debrucei-me sobre o volante e fiquei amargurando aquela dor. Nisto Pai João chegou.
“Foi mexer com a vida dos outros, teimosa! Eu não falei?”
Estou desajustada, vou matá-los!
“Baú, baú, se não matou até agora, não matará mais, nunca mais”.
Você está marchando para um sacerdócio. Feio, muito feio, eu disse. Porém, já fiz concurso de feio e você nunca fez. Rimos, e eu esqueci o incidente. E a vida passava sem que eu pudesse fazer coisa alguma. Porém eu já tinha desenvolvido minha mediunidade de incorporação. Certo dia veio me consultar um casal de jovens namorados. Queriam saber da Clarividente como seria sua vida de casados. Achei ele muito bonito e ela muito feia e petulante. Pensei, pensei e não dei resposta. Tomaria partido achara ele muito bonito para sofrer ao lado daquela moça. Oh meu Deus, tomei partido e fui ridicularizada nos planos espirituais! Sim filho, eu era uma criança e de vez em quando fazia tolices como essas. Custei a entender a mim mesma qual era a minha missão. Vivia cheia de medos da Igreja, do pecado mortal etc. Depois do último erro, eu já estava mais doutrinada, quando me vieram dizer que havia um bispo na porta, querendo falar comigo.
Gritei meus áis! Que querem fazer comigo? Um sacerdote de Deus! Fiquei por ali, sem saber o que fazer. Mãe Yara chegou e foi me levando para a Kombi onde se achava o sacerdote. Ele foi logo me dizendo: “Soube do seu fenômeno e me perguntou”.
Chovia muito e me deixaram sozinha com ele na Kombi, cheia de medo, porém lembrando-me “dos meus olhos que eu tinha entregue a Jesus”, e de que não poderia mentir, como por exemplo, dizer que eu não era espírita nem clarividente. Não tinha por onde escapar. Em que os espíritas se apegam? Na reencarnação? Mãe Yara veio. Padre fui dizendo, seus pais são dois velhinhos que são dois santinhos. Deus lhes deu a graça de terem um filho como o senhor, mas porque eles têm também outro filho que é epilético e vive pelas ruas embriagado?
“Como?...gritou ele, Como você sabe mulher?" Porque sou a clarividente que o senhor procurou. Sim, disse ainda, dívidas do passado. Seus pais e o senhor ainda se endividarão mutuamente. Disse-lhe ainda mais algumas coisas do irmão dele. Ele deu um gemido, como quem sente uma grande dor. “Realmente, meu irmão”.
E foi despedindo de mim como se sentindo incomodado. Depois, se possível, se eu pudesse ir até onde ele morava. Tudo que eu lhe disse é verdade. Não, eu não sairia dali! Tudo foi muito desagradável. Falei com Mãe Yara e ela me disse que não ficaria só nisso, outros e outros me abordariam. Foi uma dura experiência, porque realmente eu gosto da Igreja. Fiquei triste por uns dias e deveras impressionada com o susto do padre. Há outras passagens de minha vida que podem elucidar muita coisa para você que não estão escritas. Isso eu farei em outro livrinho. Um velho amigo, chegando de Uberlândia me convidou para a despedida do Zé e sua noiva. Dirigimos para um pequeno bar e lá ficamos, cantando e bebendo, todos se despedindo. Voltaram para seus lugares e estavam apaixonados em me deixar ali em Brasília, na Cidade Livre, no Núcleo Bandeirante. Tomei novamente cerveja, eu que não tinha desejos por bebidas. Em toda minha vida eu vivia para meus filhos.
Chovia muito e me deixaram sozinha com ele na Kombi, cheia de medo, porém lembrando-me “dos meus olhos que eu tinha entregue a Jesus”, e de que não poderia mentir, como por exemplo, dizer que eu não era espírita nem clarividente. Não tinha por onde escapar. Em que os espíritas se apegam? Na reencarnação? Mãe Yara veio. Padre fui dizendo, seus pais são dois velhinhos que são dois santinhos. Deus lhes deu a graça de terem um filho como o senhor, mas porque eles têm também outro filho que é epilético e vive pelas ruas embriagado?
“Como?...gritou ele, Como você sabe mulher?" Porque sou a clarividente que o senhor procurou. Sim, disse ainda, dívidas do passado. Seus pais e o senhor ainda se endividarão mutuamente. Disse-lhe ainda mais algumas coisas do irmão dele. Ele deu um gemido, como quem sente uma grande dor. “Realmente, meu irmão”.
E foi despedindo de mim como se sentindo incomodado. Depois, se possível, se eu pudesse ir até onde ele morava. Tudo que eu lhe disse é verdade. Não, eu não sairia dali! Tudo foi muito desagradável. Falei com Mãe Yara e ela me disse que não ficaria só nisso, outros e outros me abordariam. Foi uma dura experiência, porque realmente eu gosto da Igreja. Fiquei triste por uns dias e deveras impressionada com o susto do padre. Há outras passagens de minha vida que podem elucidar muita coisa para você que não estão escritas. Isso eu farei em outro livrinho. Um velho amigo, chegando de Uberlândia me convidou para a despedida do Zé e sua noiva. Dirigimos para um pequeno bar e lá ficamos, cantando e bebendo, todos se despedindo. Voltaram para seus lugares e estavam apaixonados em me deixar ali em Brasília, na Cidade Livre, no Núcleo Bandeirante. Tomei novamente cerveja, eu que não tinha desejos por bebidas. Em toda minha vida eu vivia para meus filhos.
Foi o mais terrível martírio pela brusca transformação de toda a minha vida. Meus filhos Gilberto, Raul Oscar, Carmem Lúcia e Vera Lúcia, estavam na crítica idade de estudos e desenvolvimento. Renunciei a tudo, porque somente uma lei passou a existir, o DOUTRINADOR. No dia 9 de novembro de 1959, recebi o primeiro mantra Mayante. Minha cabeça se encheu de som, quando apareceu um lindo general do tempo da queda da Bastilha, dizendo chamar-se Claudionor de Place Ferrate, o qual após contar a sua história, ditou a letra do som que eu estava ouvindo, formando então Mayante, o mantra de abertura dos nossos trabalhos. Naquele mesmo dia, eu teria que concluir um grande compromisso sentimental e, qual não foi a minha decepção, comecei a ouvir Mayante e a sentir desprezo por tudo que sentia, inclusive um compromisso de nove anos. Eu bem sabia o quanto iria pagar por aquela renúncia. Porém não vacilei, me desliguei do compromisso e voltei para minha missão, e de joelhos em frente a Pai Seta Branca, entreguei os meus olhos a Jesus pela terceira vez. Comecei a reduzir as palavras sem conseguir vencê-las, procurando sempre harmonizar em mim meus pensamentos em ações de graças ao meu Reino. Não havia mais ninguém no mundo, fiquei sozinha esperando alguém que me conhecesse, caminhando solitariamente na noite, em caminhos invisíveis e sobre os campos vazios. Chorei filhos, chorei amargamente, porém, ao defrontar-me com alguém tinha sempre um sorriso nos lábios. Dos requintes dos salões, de uma vida de luxo, conheci a pobreza inconfundível, mil conselhos e seduções, nada, porém me afastando do bem na convicção das minhas visões. Aquela mulher moça, cheia de arrogância, perdia aos poucos o seu orgulho. Filhos, Deus não criou o homem inteiramente livre e eu precisava me encontrar com alguém do meu nível, que me compreendesse. Abordada por um grupo Kardecista, pensei em sair dali, daquela serra, pois tive mais uma decepção, quando disse que estava na missão do Doutrinador e fiquei confusa. Nesse mesmo dia, um colega de minha confiança, que muito se afinava comigo, chegou naquele exato momento e qual não foi a minha surpresa, escandalizou-se, insistiu comigo para que fosse com ele argumentando: “Você está fanática, você vai deixar seus filhos sem estudo”.
Dentro de mim começou um terrível conflito. Sai com ele e fui até Alexânia que ficava a uns 14 quilômetros dali. A minha cabeça era agora um vulcão e me sentia realmente irresponsável. Conflitos, conflitos era tudo que tinha na minha mente.
“Eu compro um caminhão e ponho na sua mão e você vai pagando; você é a única mulher profissional. Você mascateando?”
Ele me ridicularizou ao máximo e despediu-se dizendo com água nos olhos: “Me corta o coração, nunca mais porei os pés aqui, não quero vê-la nesta miséria, neste fanatismo. Pense em seus filhos Neiva!”
Sentados na estrada ele se despediu e se foi, dizendo que confiava no meu retorno à estrada e juntos daríamos uma festa. Ouvi uma voz dizer: “Vai fia!”
Continuei sentada ainda na estrada e tapei os ouvidos para não ouvir o barulho do motor do caminhão.
“Vai fia”, disse Vovô Indu na minha audição. Pensei, como sou querida! Os espíritos preferem que eu desista a me verem infeliz. Meu colega saiu tão amargurado.
Quando me levantei, já vinham atrás de mim e começaram os sermões. “Neiva, nesta missão em que nós confiamos a você, não podemos ter um gesto irregular, é feio para nós”.
Porém, a minha dor agora era tão grande que eu mal ouvia aquelas palavras. Resolvi então continuar a minha farsa de companheira de Getúlio. Assim pude manter um pouco o respeito, sem causar tanto ciúme. Sim, meu filho, no campo da vida cada inteligência se caracteriza pelas atribuições que lhes são próprias. Senti, pois que a estrada é longa e que se processa, a cada passo, lentamente pelo chão. “Sede, pois, vós outros perfeitos, como perfeito é o vosso Pai Celestial” (Mateus 5:48)
Daquele dia então, transformei a minha vida, e a fiz um facho de luz e amor, sentindo que as minhas dúvidas eram imortais. Preenchi todas as necessidades, fazendo das minhas ilusões um clarão de alegria a todos os meus desejos. Aos poucos fui me realizando com as curas constantes; fui superando as minhas frustrações, me colocando e passando a viver sob um céu espiritual de uma outra natureza, da qual dia a dia ia me conscientizando na minha clarividência.
Dois anos se passaram, estávamos agora em princípio de 1960, quando recebi de Pai Seta Branca a primeira missão. Eram seis horas da tarde e eu, mais do que nunca, sentia uma grande saudade, porém desta vez era algo mais fino, alguma coisa que eu não conhecia. Sentei-me na ponta do morro, embaixo do meu pequizeiro, quando Pai Seta Branca começou a fazer o meu roteiro e a mostrar tudo por onde eu passaria e a minha missão. Traçou então o meu sacerdócio ao lado de Umahan. Senti uma forte dor de cabeça e uma sensação de mal estar, e só me dei conta quando estava diante de um velho cor de cuia, barbas longas vestido com uma balandrau que me disse: “Salve Deus! De hoje em diante terás a força de uma raiz”.
Foi difícil. A partir daí, mais ou menos às quatro horas da tarde começava o meu trabalho. Então me sentia como se estivesse com 38 graus de febre, minha cabeça rodava até o ponto de não me aguentar de pé. Deitada, as tonteiras se acentuavam e eu entrava numa espécie de sonho, um sonho em que me desprendia do corpo com perfeita consciência. Cada dia eu melhorava o meu padrão vibratório, consciente do meu trabalho. Então recebi de Pai Seta Branca novas instruções: para entrar num plano iniciático teria eu que fazer as pazes com todos aqueles que se dissessem meus inimigos. Então, já no terceiro ano de conhecimento ao lado de Umahan, segui até as cavernas a pedir paz e amor aos reis dos submundos. E assim o fiz. Me transportava e humildemente lhes pedia acordo, pois a nossa Lei não admite demanda. Fui à presença de sete reis, que me tratavam com mais ou menos ferocidade, porém eu reagia com amor e muita timidez. No caso do “Sete Montanhas” recebi até uma grande proposta. Ele quis me comprar de Pai Seta Branca e eu prometi falar com ele. Fazia as minhas recomendações e prosseguia, apesar do meu tremendo pavor. Nesse período eu vivia sobressaltada. Num desses dias que o sol não aparecia, ocasiões essas em que nossos pensamentos ficam mais tristes. Eu tinha muita coisa para fazer, porém me sentia um pouco sem forças. Recostei no meu pequizeiro e adormeci, me transportando.
Entrei num suntuoso castelo. Tudo era riqueza e não me foi difícil saber que estava diante do trono do poderoso, o Exu Sete Flechas.
Dois grandes homens com pequenos chifres me seguravam pelos braços num gesto deprimente, enquanto o rei vociferava: “É inofensiva, tragam-na até aqui. Já tenho conhecimento dos seus contatos, e virando-se para mim continuou dizendo: sua pretensão é muito grande em querer acordo, quando não tem nem mesmo um povo para a defender”.
Respondi: Vou levantar um poder iniciático e quero fazê-lo após vossa licença neste acordo, para que o seu “povo” não penetre na minha área. “Já sei muito bem, disse ele, das suas intenções. Eu me comprometo de não penetrar em sua área, antes, porém vou fazer um teste com você para lhe fazer sentir a minha força”.
Eu disse apenas: Salve Deus!
“Quero ver se você tem proteção, se ela a livrará de mim. Amanhã às três horas da tarde, vou arrancar todo o telhado de sua casa. Quero ver sua força!”
Voltei para o corpo sentindo o sabor desagradável daquela viagem. Tornei a voltar onde ele estava, porém em outro local, em outro salão e desta vez tudo foi pior. Ele jurou na verdade que não tocaria nos meus filhos Doutrinadores, porém só se realizaria quando medisse sua força comigo. Sustentei sua ameaça três anos, até que um dia, eu já estava em Taguatinga, senti que as coisas estavam ficando perigosas. Fui pela terceira vez falar com ele e qual não foi o meu sofrimento: sua ameaça estava de pé! No meio de risos e deboches ele me disse que às três horas da tarde arrancaria o telhado de minha casa. Pensei em não ter medo, se ele até hoje não arrancou, não arrancaria mais. Qual não foi a minha surpresa: uma velha, dessas que vivem para melhor fazer suas cobrancinhas, mais ou menos às duas horas da tarde, começou uma das suas.
“Oh, irmã Neiva, como vai? Eu precisava tanto falar com você, mas dizem que você não fala com os pobres”.
Eu fiquei possessa com a velha, baixei a vibração, e então só ouvi o urro do telhado, foi tudo para os ares! Só Deus sabe como fiquei humilhada. Pensei; Neiva você fracassou apesar de todas as instruções que recebeu.
Porém, sempre pensando como vivia o Aprígio Neto, pagando suas dívidas sem consolação sem sentir, comecei a me lembrar das palavras de Umahan: “Fia! Desde que há criação no mundo físico, todos vem tentando conseguir uma vida permanente, mais a lei da própria natureza física é imutável, ninguém escapa das mãos da morte. A verdade é que ninguém pensa em morrer, envelhecer ou adoecer. A lei da natureza não muda, não imuniza contra a morte. A ciência nuclear descobre muito, porém está sempre nas mãos das moléstias, da velhice, da morte e do nascimento. Sendo assim temos por obrigação corrigir o nosso conhecimento”.
Finalmente, seu Aprígio era Manoel, seu próprio neto, com 23 anos e o mais prejudicado de todos. Tive tanto susto que quase morri. Porém deslumbrada como estava, à noite fui bisbilhotar a procedência de tudo. Sentei na minha pequena praça e de longe ouvia o murmúrio de casais chegando dos seus trabalhos. Em seguida ouvi uma voz: “Ajudar sem participar. Cuidado, você não devia dizer que o tal seu Aprígio estava reencarnado em Manoel seu neto, porque não podemos causar ansiedade nos outros pelas ações do nosso corpo, pelos pensamentos de nossa mente ou por palavras”.
Voltei para Umahan para que ele me dissesse o que teria que fazer.
“Fia...(me disse), terás que passar por todas as provações. Impusestes ao teu companheiro viver ao teu lado. Hoje ele se cansou e, pelo que sei de Seta Branca ele tem uma filosofia adequada para o terceiro Milênio e para uma nova era: o homem vivendo pelo amor da família, nunca fica infeliz ou aflito por coisas desejáveis ou indesejáveis criadas pela mente; ele torna-se um devoto puro na sua personalidade em Deus”.
Tudo que o homem forja na mente está errado. O homem deve se sentir seguro nos seus sentimentos. Vocês não se amam e não poderão viver assim. Lembre-se sempre que, enquanto tiver um corpo matéria terá que enfrentar todos os aspectos físico dele, descobrindo o que lhe é saudável.
Não fuja das leis físicas, através das quais terás que conquistar tua identidade espiritual. Estás com teu orgulho ferido, porém, tão logo pagues o teu débito te libertarás desse companheiro. Não te identifiques, falsamente, com o teu corpo material, grosseiro. Nem consideres que os corpos se relacionam com corpos por suas propriedades. Cada um gera a sua lei. Não é vantagem inserir teu corpo no que quer que seja. Continue normalmente respeitando teus sentimentos nas leis que sempre te regeram. Estou certo? Sim, está certo. Porém eu estava arrasada, humilhada perante todos na comunidade. E mãe Neném?
“O que realmente não queremos é que sejas frustrada. Neném te reprova porque sua vida conjugal a traumatizou, a ponto de perder o equilíbrio. Mas esse é um detalhe corriqueiro. Se tu não fosses uma criatura perfeita não conhecerias com tanto amor os teus irmãos. Não passes por religiosa simplesmente, pela forma ou pelo nome, não sejas como um falso profeta!”
Eu continuava muito desolada. Ele me olhou e continuou, com muito amor: Pobre Neiva é tão jovem para saber da morte. Disse isso como se não me visse ali perto. Dei um gemido como se quisesse arrebentar o peito. Conhecerá, filha, a verdade e ela te libertará, porque a sua luz resplandecerá em ti. A tua tarefa deve ser encarada como um santo sacerdócio e a tua responsabilidade é grande pela força que te foi confiada. Deves sentir a mais doce e mais humilde tolerância. Sim, tolerância com amor. Detém no lado bom das pessoas, das situações e das coisas. Cries esperança e otimismo onde estiveres, em favor dos outros, sem pedir recompensa. Auxilia muito e espera pouco ou nada. O teu mundo estará sempre aos teus pés, porém nunca acharás lugar para os teus desejos. Viverás sempre carente porque não terás irmã por estes vinte anos. A noite iluminará os pequenos diamantes da tua cabeça, porque caíram das estrelas. O que tens a fazer é marcar o local do teu altar, do teu sacrifício, para a grande convulsão que está escrita no rumo do largo portão da nova Aurora. O teu som estará sempre unido aos apelos da noite e do dia. Calei-me, envergonhada e perguntei o meu nome iniciático.
Ainda te chamas Neiva e só mudarás o nome quando forem contados em tua cabeça 108 pequeninos diamantes. Então não sentirás receio algum deste mundo. Eu sofro, reclamo, porém minha consciência é pura, disse eu. Sim, e aí de ti se não fosse. Respeito a Luz do Evangelho e tudo que me compete entender. Sim Neiva, estarei contigo até o fim, porque não há felicidade sem esclarecimento, digo felicidade real. Filha sei que o conhecimento da Uni Presença Divina ainda não penetrou na tua mente, e por isso não te acode nos momentos de tuas necessidades. Filha és dura como uma pedra, porém eu saberei lapidá-la. Olhei para aquele velho de barbas longas, cor de canela, pés descalços, um manto branco encardido. Sai dali com o coração pesaroso, porém desta vez sentindo saudades e tristeza. O dia amanheceu. Sai do meu quarto ouvindo vozes, mil perguntas e respostas. Pelejava para me lembrar o que estava acontecendo ou o que aconteceu e não conseguia coordenar coisas alguma. Nisso dois jovens começaram a brigar em luta corporal e eu não vacilei, corri para apartar a briga. Santo Deus!, gritei. Passei a mão num pau e marchei para cima dos briguentos. Então minha cabeça rodou e ouvi a voz de Umahan: “Filha, a força não está na violência e sim na moral”.
Joguei o pau fora e gritei, porém desta vez sem tomar partido, Pai Seta Branca! Realmente tudo se acabou, voltaram ao normal. Foi dito que era uma falange de cobradores e tudo terminou bem. Sentei-me num tronco que servia de banco, pensando na incoerência dos fatos: Meu Deus, como poderei vencer? Como será minha vida um dia? Eu pedi, que o Senhor, meu Mestre, curasse o meu coração e a minha dor? Ouvi a voz de Umahan: “Não filha, o nosso coração só se cura pelo esclarecimento”.
Comecei a me preocupar, quem fui eu? Por que me deram tudo? Por que estão tomando?
“Sim Neiva, ouvi o que pensastes. Tivestes que encontrar com Marco Antonio, tivestes que formar o teu império perdido. O mundo te chama não ouves?"
Oh, meu Deus!... gritei. Agora me sinto doente, como vou viver?
Meus filhos sem estudar, sem eu para criá-los, como será?
“Sim, és clarividente, poderás saber de todo o teu futuro e, queres saber, já estou cansado dos teus gemidos, assim não chegarás”.
Naquele exato momento chegou Mãe Neném espraguejando:
Vou-me embora, não aguento mais estes miseráveis caipiras, só querem explorar a gente, só querem remédios! Então, simultaneamente eu ouvia as duas vozes; a pobrezinha não perdia as esperanças, e no meu intimo eu estava recebendo a minha lição. Envergonhava-me de tudo. Agora quem tinha vontade de correr era eu. Realmente eu estava ficando indefesa com tantos problemas. Meus filhos ficaram somente com o curso ginasial e isso me horrorizava. O tempo não ajudava, estava caindo muita chuva. Comecei a pensar em como sustentar toda aquela gente se não pudesse mandar buscar mandioca para fazer farinha, que era do que vivíamos. Nisso parou de chover e me dispus a sair de casa. Olhei para o céu e uma ave voava bem alto.
“Vê Neiva, disse Mãe Tildes. Vê aquele pássaro a voar. Jamais se ouviu dizer ter caído algum por falta de alimento. Pois assim também os teus pequeninos filhos, como as aves, tem a benção de Deus. Não poderás nunca tomar conhecimento de um sonho quando ele está presente. Fostes iniciada e a iniciação significa estar em contato íntimo com alguém que está acordado. Todos dizem que no mundo físico os loucos não gostam de viver, porém é tão difícil um suicídio. Neiva se puderes esperar, mesmo que seja um ano, tua mente se tornará silenciosa por si, automaticamente. As perguntas pouco a pouco vão perdendo o sentido. A mente simples é inteligente e fértil. Estabeleças uma norma para as tuas perguntas e as gerações se exaltarão em ti. Filha, não queiras saber agora de onde vens e nem para onde irás. O vento te levará para longe e te dirá tudo; quem vem por ele, te conhece e te ama. Sim, não cai uma só folha de uma árvore que não seja pela benção de Deus, pelo vento, sim pelo vento e pela chuva!"
À noite eu estava exausta, rolava na cama quase em desespero. De repente adormeci ou me transportei. Estava agora em uma pracinha, que há muito me era bem familiar. Bem consciente via e ouvia o que se passava, quando senti alguém sentando perto de mim.
“Sou Amanto”
E eu sou Neiva! Não me conheces, Neiva, sou um dos componentes de Pai Seta Branca. Sou Inca. Sim, o Inca! Quis logo lhe encher de perguntas, porém lembrei-me de Mãe Tildes. Mente simples, mente fértil. Ele naturalmente, sentindo o que me vinha à mente, sorriu e disse: Estás recebendo ricas lições. És prisioneira, sim, prisioneira da poeira da terra, porém estás se preparando para receber uma corrente inquebrável. Depois de me refazer da sua figura resplandecente, fiquei pensativa, até que ele me disse:
"Sim Neiva, é a continuação da Terra, e daqui partimos para diversos planos."
Senti realmente que as questões me confundiam, mas ele foi dizendo coisas e eu fui me encontrando. Dizia ele: "Este grande vale é o mais triste, é o “Vale Negro dos Incompreendidos”, porém daqui, desta ponta, visualizamos tudo. Também daqui buscamos energias em diversos locais, suas heranças e seus charmes para lucidez”.
Lucidez?
"Sim, lucidez. O espírito ao receber a benção de Deus se esclarece e toma o seu destino. Aqui onde estamos, nesta pracinha, chamamos de Ponta Negra, porque é o limite deste tenebroso vale. Veja, aquela é uma enorme cerca magnética. Eles podem chegar até perto, porém não ultrapassa esta cerca. Os bandidos do Espaço respeitam este vale."
Porque Bandidos do espaço?
“Andre Luiz definiu os Bandidos do Espaço de maneira fácil de ser entendida na Terra”.
Não conheço bem André Luiz, porém conheço o Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo.
Sim Neiva, porém são perigosas as tuas interpretações; o Evangelho, realmente, o Santo Evangelho. Precisas ter estrutura, base, para interpretá-lo. Jesus!, disse num gemido. As estranhas narrações contidas na lenda dourada, por mais fabulosas que sejam, só refletem a mais alta antiguidade cristã, são mais parábolas. Não entres na estrada antiga Neiva! Porque tu viestes para reformar. Não tens Mestres? Não te foi dado um magnífico Tibetano? Não vives a filosofar com ele? Empolgada com exuberante figura de Amanto ia dizendo, sim, um velho muito desgostoso, que vive enclausurado, e quase morri de susto, Umahan estava na nossa frente. Oh! Gemi, os dois se encontraram. Fiquei muito envergonhada. Eles, porém eram tão superiores que me senti como um pequeno peixe em alto mar. Daí eles partiram filosofando, novamente o contraste. Oh, meu Deus!
Sai dali dando ordens, levei a enferma para a cama e fiquei aflita esperando o medicamento, que tinha ido buscar em Alexânia a uns 14 km. de distância.
A Rita sangrava pelos poros e pelas gengivas. Sentei-me ao lado dela e senti muito sono. Cerca de uma hora depois chegou o medicamento e a fiz ingerir nem sei como dois vidros de óleo de rícino e uma cápsula de calomelano. Tinha feito tudo por ordem de Vovô Indu, e porque também não tinha outro recurso, só havia médico em Brasília a três horas de viagem de carro ou esperando o ônibus, pois não havia carro. Termina a “operação”, isto é, fazê-la engolir tudo, começaram a surgir às dúvidas e o medo da minha responsabilidade. Afinal se tratava de uma jovem de dezenove anos e a mordida tinha sido de cascavel, que segundo me disseram tinha muitos anéis na cauda. O dia estava acabando de amanhecer. Saí de perto da doente e fui lá fora tomar um pouco de ar, pois me sentia sufocada. Encontrei Mãe Neném e ela me encarou como se eu tivesse cometido um crime,
“Neiva, cruz credo! Você está louca! Se essa mulher morrer”.
Eu respondi: Foi Vovô Indu. Quero só ver. Não Mãe Neném, não fale assim pelo amor de Deus! Ela ficara boa. Cuidado, disse a voz de Vovô Indú, você só poderá contar com a vitória às seis horas da tarde, dependendo da sua fé e de sua confiança. Oh, meu Deus! Gemi. Lembrei da ciência e da fé, uma lição inicial do Mestre Umahan. Às três horas da tarde a moça já não falava. Eu perguntei que fazer?
“Na Terra você já fez tudo, disseram, porém a força da mediunidade não tem limites”.
Continuei então fazendo as minhas preces. Mãe Neném me chamou. Não tive tempo de lhe contar direito o meu encontro com Chico Xavier. Ele me disse que sua clarividência é algo magnífico. Porém você deveria estudar um pouco, procurar a Federação. Assim como estamos é um pouco perigoso. Você não acha que está certo? Vá a senhora que eu fico aqui, vá, disse já com desprezo. Olha Neiva, eu acharia bom se pudesse, porém o Chico é um santo.
Não tenho dúvidas da sua santidade, porém vá. Não quero nada do mundo que anule a minha personalidade, vá a senhora. E vou lhe dizer mais ou a senhora fica aqui ou lá. Cruz credo, Neiva!
Temos que saber o que é melhor. De mais a mais, aquelas histórias que você me contou, dos Exus, de fazer tratos com eles, não gostei. Perguntei: contou ao Chico? Claro, porém ele sorriu. Oh, meu Deus!... por que tudo isso? De que servirão essas humilhações? Olhei para Mãe Neném e me pus no lugar dela. Talvez fizesse o mesmo. Em meio do calor do conflito, me chamaram do pequeno ambulatório onde estava a doente. Dado o tom de urgência de quem chamou fiz menção de correr junto com os outros. Em vez disso corri para “o que era meu”. Como contei antes, “o que era meu” era na verdade o lugar embaixo do pequizeiro onde eu ficava a meditar e a fazer meus transportes, com as pernas penduradas no quase abismo, encostada na árvore como se fosse numa poltrona. Foi para lá que eu me dirigi. Fui para lá como de costume, porém uma força grande me impediu e uma voz imperativa me disse: “Volte!, volte já” Sem entender muito bem, voltei correndo e pensando se aquela “coisa” era boa, se gostaria que eu me arrebentasse. Coisa horrível! No meio da corrida chamei Mãe Tildes e ela explicou que era voz direta deslocada pelo Nêutron. Dirigi-me então para o ambulatório e tão grande foi a minha surpresa que quase desmaiei. A moça estava sentada na cama, sentindo apenas fome. Mãe Neném e eu nos olhamos com carinho e amor e juntas fomos para o Templo agradecer a Deus. Voltei e de longe ouvia as meninas cantando, fiquei ali parada por alguns minutos. Logo surgiu uma linda lua no céu, fiquei sentada no banco de tábua embaixo da árvore. Gertrudes me trouxe um prato feito que comi na realidade sem saber o que comera. Sim, muitas coisas aconteceram. Sozinha naquela serra, com mil preocupações na cabeça. Sozinha, sim, como é triste a solidão. Lembro das queixas dos “mal amados” e pensando em suas solidões, comecei a fazer críticas, julgando. Estes também estão sozinhos por falta de tolerância, finalmente devemos pensar na solidão da velhice.
Neste instante, meu companheiro chegando de mansinho segurou nos meus ombros, dizendo: “Já pode me perdoar Neiva? Vamos embora daqui, eu não suporto isto mais. Mãe Neném lhe trouxe o recado de Chico Xavier? Ele faz críticas a seu respeito”.
Foi como se me tivesse dado uma punhalada, perguntei: E você acha que eu, realmente preciso estudar? Não, absolutamente, disse, ser louca como os demais? Você me ensinou que o homem se evolui em todos os lugares, porque ficar aqui nesta serra com tanto desconforto? Eu não sei o que me espera, disse, porém continuarei até terminar o meu curso com Umahan.
"Meu Deus!, eu não estou preparado para tanto, principalmente ser companheiro de uma clarividente. Às vezes penso que a amo, mas, quando estou ao seu lado, sinto que você está distante. Como sofro por isso!"
Estávamos nos entendendo, quando Mãe Neném chegou e disse o que lhe vinha à cabeça: “Que Chico Xavier tinha razão, que a minha ignorância esta inclusive me atrasando, que ninguém saberia decifrar as minhas visões, que Urubatan era um Exu e que tudo estava errado. Imagine que o Sisenando recebeu uma comunicação de que ele, Urubatan queimou o meu dinheiro”. Sim, respondi, simbolicamente. O barraco de Mãe Neném havia realmente se incendiado na Cidade Livre. Meu Deus!, o que tenho com tudo isso? Lembrei-me de Umahan e sua filosofia: “O corpo físico é para a alma encarnada aquilo que a máquina significa para o operário”.
A doença já se manifestava no meu corpo. Eu, portanto já não era a mesma.
Caminharás muitas vezes no mundo, a maneira de um barco no oceano revolto. Com esse pensamento ouvi a voz de Umahan: “Não culpe o médico, não acuse o professor, não reprove a conduta dos outros, não maldiga a poeira da terra. Aproveita o teu tempo em aprender, porque é muito mais tarde do que pensas. Deves sentir a mais perfeita tolerância por todos e um interesse, com sinceridade, pelas crenças dos que pertencem a outras religiões. Não te importes pelo que demonstrem pela tua, e, para que possas ajudar é preciso te libertares de falsos preconceitos."
Não deves desprezar Mãe Neném, sê condescendente em tudo, sê benevolente.
“Agora os teus olhos estão abertos para que possas empreender um trabalho de ordem superior”. E continuou: “Pobre Neném! A superstição é outro grande mal, que tem causado muitas terríveis crueldades, fazendo sofrer os homens, as plantas e os animais. Os fenômenos se dizem religiosos e fazem mal em nome de suas religiões. Se anseias te unificar com Seta Branca, que nunca seja por amor a ti mesma e sim para que possas ser um canal, através do qual o teu amor chegue aos teus semelhantes. Só temos consciência do corpo que vai morrer, não temos consciência do nosso estado de Consciência Interior que é mortal. Faz filha, atua parte e lembre-te que sempre és capaz de fazê-la. Não te esqueças que a mente tem truques e a consciência é algo inegável. A única esperança para um homem perdido no meio do Oceano é que alguém venha tirá-lo dali. Se alguém vem e o levanta ele se sentirá aliviado. Não abandones teu companheiro!”
Enquanto Umahan falava o meu companheiro parecia adivinhar e me olhava com ternura e Mãe Neném pragueja: “Cruz credo, vou embora desta miséria!”
Continuei calada ouvindo em dois planos. Nos abraçamos e eu pensava. Oh, meu Deus! A alma espiritual é realmente uma partícula tão diminuta que se encontra dentro do corpo e não a podemos ver. Despertei dos meus pensamentos pelas súplicas contínuas: “Vamos embora daqui!”
Acalmei-os com algumas palavras de doutrina.
O bendita natureza!, como pode acontecer um fenômeno desses? Quando você esta incorporada, seus olhos estavam fechados e, às vezes, abertos. Foi lindo, lindo.
Eu?
Sim, você, Neiva.
Fiquei revoltada sem dizer nada, enquanto o fenômeno era comentado. Na verdade Vovô Indu incorporou em mim e fez o parto, que segundo fiquei sabendo, era normal. Sempre havia fenômenos. Os mentores escolhiam o melhor. Certo dia estava diante de Umahan, reclamando de minha vida, quando ele me disse: Neiva, ninguém quer morrer, todos só querem viver até quando possam arrastar a sua vida. Essa tendência é visível, não só no plano individual, como no coletivo. A integridade da vida humana, só pode ser realizada quando uma pessoa se preocupa no serviço do todo, completo.Existe um céu espiritual, existe outra natureza que está além da manifestação e da não manifestação. Vamos Neiva, preciso, hoje, te levar a prova. Salve Deus!
Naquela madrugada fui até Ponta Negra, a minha triste pracinha, onde sempre me encontrava com Amanto. Como longas fitas de muitas cores, recamadas de fios dourados, refletindo mil luzes, pouco a pouco separava os dois planos que eu simultaneamente visualizava. Quanta beleza triste eu sentia. Era a história de vidas humanas etéricas, que se espalhavam por todo aquele Vale, de todos os gêneros. Ali, sim Neiva, me disse alguém. Ali onde descem as trevas da noite, e sorrindo com ternura no olhar ele me ofereceu uma dádiva secreta, e no fundo do meu coração esta dádiva brilha. E assim tudo morrerá e tudo viverá, porque Deus é a natureza. Fechou-se o santuário íntimo da Alta Magia, dádiva esta que somente o alto limite te fará compreender. Comecei a viver um terrível contraste. Contando as pessoas os fenômenos de minha viagem, todos dizem: Você que é feliz Neiva! Não era verdade, eu sofria muito. Minha enfermidade piorava dia a dia, como também aumentava os enfermos, os desesperados e as despesas, que eram só minhas. Resolvi fazer uma fábrica de farinha e outra de telhas. A de telhas o Raul, meu filho, tomava conta e fabricava tranquilamente telhas coloniais. A farinha eu e a criançada fazíamos. Gilberto com um caminhão puxava a mandioca, que era a matéria prima. Puxava também barro para as telhas. Nas horas vagas fazia fretes. Gertrudes tinha uma pequena pensão. Carmem Lúcia e Vera Lúcia cozinhavam e levavam para as crianças do orfanato. Ninguém reclamava; pelo contrário, me davam forças para que continuassem. A sabedoria para ajudar; o amor que inspira a vontade de servir; essas são as tuas qualidades, Neiva. Certamente ninguém deve acalentar desequilíbrio; raciocínio sem aspereza; sentimentos sem preguiça; caridade sem pretensão; conhecimento sem vaidade; cooperação sem exigência; devotamento sem apelo; dignidade sem orgulho e, por fim, o mais importante dessas palavras do seu comportamento, respeito sem bajulice.
Eram palavras que não saíam da minha mente. Sim, porque a fé sem conhecimento do bem, não evolui a tua mente, Neiva! De bom grado combina com o canto imortal. Meu Deus! Como poderei viver, se as forças me faltarem? Parece que todos estão contra mim? Fui então procurar o Gilberto, Carmem Lúcia, Raul Oscar e Vera Lúcia e lhes disse quase adulando: Meus filhos vamos embora daqui, já não suporto mais. Não mamãe, não podemos sair daqui. Pai Seta Branca poderá perder a aposta com Yemanjá! Sim, Pai Seta Branca nos disse que havia uma aposta com Yemanjá, que lhe daria um anel se eu não levasse esta obra até o fim. E nosso amor por Pai Seta Branca sempre foi muito grande. Num gemido fiz esta prece, talhando na velha estrada: Senhor, deste-me a palavra por semente de luz. Auxilia-me a falar para que se faça melhor. Não me permita envolvê-la nas sombras que projeto. Ajude-me a lembrar o que deve ser dito. E a levar da memória tudo aquilo, que a tua bondade espera ser dito. Não me deixe emudecer diante da verdade. Onde a irritação me perturba. Induza-me o silêncio, porque ainda dou acesso às chamas da ira. Ajuda-me, também senhor! Que a minha palavra te obedeça a vontade de hoje e sempre. Salve Deus!
“Neiva”! Ouvi Umahan. Ouviu os teus filhos!, te deram uma lição. Não há consciência sem compromisso, como não existe dignidade sem lei. Vejo que trazes em teu coração o raciocínio sincero, sem aspereza, sem preguiça e sem exigência.
Respondi meio confusa; Mãe Neném está exigindo muito.
Neiva, não contratastes nem um engenheiro para te garantir do sol que te sustenta, e nem assalarias empregados para a estação na atmosfera, afim de que renovem o ar que respiras, seja como for, te convenças de que Deus está conosco em todos os caminhos.Confia, siga, trabalhe e continua. Chega meu Mestre, a minha cabeça é pequena. Isto é o que você pensa! Zele pela tua lâmpada para que as perturbações do caminho não te façam mergulhar nas trevas. O trabalho é a chama que define a vida. A fé é o óleo que sustenta e clareia a estrada, para que se acolham na luz que te cerca. Os casos de dúvidas e dos conflitos nos seres encarnados eram as armas sempre apontadas para mim. Finalmente, o que é a vida senão a ação permanente da força sobre a matéria. Sim, em força a matéria se resume se sintetiza e se define. Sê tu, toda e verdadeira na vida. Tua fé viva, tua lâmpada.
Oh, meu Deus! Como poderei seguir? Como será a minha grande luta? Se os acontecimentos relacionados com a vida reduzem os erros em quem tanto confia. A força matem este Universo, regido por leis comuns, naturais, numa seqüência tão lógica! Por que complicar o processo evolutivo? Oh, meu Deus! Como irei explicar ao Doutrinador esta continuação? Eu era toda esta filosofia! Para que ver tantas coisas? Quem me acreditará? A luz da razão,
Neiva. Ninguém se nega ao espírito da verdade, ele fala uma língua correta, materializada. Existe um Sol Interior, cujo sol reflete no nosso rosto. É muito equilibrado e ilumina também os nossos rastros. Então as pessoas que vem nos acompanhando vêem claro o nosso caminho?
Então as pessoas ficam presas em mim?
Não Neiva! Ninguém alcança os teus passos, apenas seguem. Meu Deus!
Preferia os meus caminhões.
Neiva! Fixe na Doutrina e em suas revelações alternadas. A força agindo em obediência às leis evolutivas utiliza-se da matéria no estado primário desta, e com ela forma corpos e realizam fenômenos incontáveis e indescritíveis, que escapam a apreciação comum, considerados os limitados recursos deste planeta. Neiva, amanhã será outro dia, cuida do que puderes, sem te preocupares, com o futuro dos outros. Nós não temos um futuro definido, porque tudo depende de nós mesmos. Vamos filha, ânimo! O dia de hoje já nos trouxe muitas preocupações, por que nos preocupar com o dia de amanhã? Jesus! Sim, realmente, no outro dia tudo foi diferente.
Fui levada a diversas provas, porém já conscientizada pelo meu consolador.
Estou infeliz. Querem que eu adivinhe. Jogam agulhas no chão escuro para eu achar e apanhá-las. Sim, eu acho as agulhas, porém uma coisa me entristece: é sinal de que eles não acreditam em mim. “Salve Deus Neiva, Salve Deus Neiva! Precisas distinguir entre o verdadeiro e o falso, deves aprender a ser verdadeira em tudo, em pensamento, palavras e ação. Por mais sábia que sejas, um dia, ainda terás muito que aprender. Todo conhecimento é útil e dia virá em que possuirás muito, amor e sabedoria, e tudo se manifestará em ti. Entre o bem e o mal, o ocultismo não admite transigência; custe o que custar é preciso fazer o bem e evitar o mal. Teu corpo Astral-Mental se aprazerá em se imaginar, orgulhosamente separado do físico”.
Eu ouvia como se estivesse distante dali. Ele me observou dizendo: “Neiva! Gostas de pensar em ti mesma. Seta Branca está incessantemente vigilante, sob pena de vires a falir. Mesmo quando houveres te desviado das coisas mundanas, ainda precisa meditar fazendo conjecturas. Jesus nos adverte: Antes de culpar o teu vizinho, porque não ser sincera contigo mesmo?”
A tua vidência é algo sem limite, tens tudo para fazer o bem e o mal. Se fizeres o mal te destruirás e se fizeres o bem crescerás como a rama selvagem. Não te esqueças também, que acima de tudo, estás aqui para aprender e para guardar segredo, mesmo fazendo mistério das tuas revelações. Esforça-te por averiguar o que vale a pena ser tido. Lembra-te que não se deve julgar uma coisa pelo seu tamanho. Uma coisa pequena, muitas vezes, tem maior sentido. Não deves acolher um pensamento somente porque existe nas escrituras durante Séculos. Deves fazer distinção entre o que é útil ou inútil. Alimentar os pobres é boa ação; porém alimentar almas é ainda mais nobre e útil do que alimentar os corpos de quem quer que seja. O rico pode alimentar o corpo, porém somente os que possuem o conhecimento espiritual de Deus, poderão alimentar as suas almas. Quem tem o conhecimento tem o dever de ensinar aos outros. A tua responsabilidade Neiva, será a maior do mundo. Nunca poderás dizer tudo e não poderá, também, se calar. Dizendo tudo isso, começou a contar este exemplo: “Eu era muito jovem quando me enclausurei neste mosteiro. Porém, antes de entrar aqui tive grandes experiências, e eis o que vi: Houve um tempo em que a Índia era o ponto principal para revelações. Vinha de muito longe curiosos, romeiros, magos e videntes e viviam por lá a espreita das oportunidades para suas alucinações. E uma destas aconteceu com a família de um lorde que veio da Inglaterra, para saber do destino de seu filho recém nascido. O mestre que o atendeu estava de saída. Os seus companheiros já o estavam esperando na célebre porteira, para assim cada um ter designada a sua direção. O fidalgo insistiu, e então o mestre contou, sem amor, o que via no destino do menino: disse que o filho dele teria um mau destino e deu todo o roteiro de sua vida: em tal tempo acontecerá isto, em tal tempo será assim. O fidalgo saiu dali em desespero; o seu filho que até então era a sua alegria, passou a ser a própria sentença. Daí por diante não fez outra coisa senão sofrer, a espera dos acontecimentos, por toda a sua vida. Porém nada aconteceu; o jovem foi feliz, casou-se e nada de mal lhe aconteceu”.
"Quanto ao fidalgo seu pai, ele amargurou toda a sua vida. As suas vibrações, não preciso dizer, destruíram o impensado mestre. Ninguém tem a intenção de magoar ninguém. Porém o pecado da palavra impensada de um mestre ou clarividente é algo muito sério. Neiva veja sempre em sua frente um fidalgo, o homem que sofreu a conseqüência do seu orgulho. Porém nunca faça como o impensado mestre, nunca participe com alguém. Serás antes de tudo uma psicanalista. É bem melhor que as pessoas saiam de perto de ti te desacreditando, do que desacreditando de si mesmas. Volte para o teu corpo filha, e vá enfrentar as feras, como dizes. Porém saiba que todas são melhores que tu, elas não tem um ideal como tu, elas sofrem pelo teu incontrolável temperamento”.
Me julgam com se eu fosse uma... porque sou motorista. Agora para ti tudo é bom no caminho da evolução, e dizendo isso, se fixou, e eu me senti em casa. Fiquei meditando sobre as coisas que ouvira. Uma das coisas que Umahan me disse e me impressionou: “Os corpos se deslocam para realizarem as curas; o serviço é a chama que lhes define a vida e clareia a estrada. Os que se acolhem nas sombras, entre eles encontrarás os que julgam. Sim, os infelizes que na Terra só souberam julgar os seus irmãos cativos da ignorância e do ódio”.
Oh, meu Deus! É impossível uma mudança tão atroz, porém, não obstante, aos meus protestos e minha incompreensão inicial, eu estava me evoluindo dia a dia. Tinha uma lição em cada canto, ia aprendendo a iluminar nas sombras, sempre a explicar que quem ama na Lei do Auxílio está imune a qualquer tragédia de dor. Não tinha grandes conhecimentos da Lei do Carma e sofri então a primeira decepção. Certo dia, eu estava muito atarefada, quando uma bonita e jovem senhora, me pediu pelo amor de Deus, que eu internasse quatro filhos seus e mais dois sobrinhos, por conseguinte seis crianças. Vendo uma mãe oferecer seus filhos, na minha inexperiência, era algo muito sério. Apesar da habitual intransigência de Mãe Neném, fiquei com os meninos e a mulher se foi. Acostumada a fazer os meus cálculos, pensei.
Tudo dará certo, organizarei melhor minha fábrica de farinha e tudo seguirá realmente o curso normal. Nessa noite, na madrugada, vi uma rica passagem no plano espiritual. Via a linda Isadora se envenenando com o conteúdo de um grande anel no qual guardava veneno, com o qual tinha envenenado a minutos. Sabia que Isadora estava encarnada em uma daquelas mocinhas que me enchiam de cuidados. Porém aconteceu o inevitável, Isadora, atualmente “Nair”, ficou tomando conta da casa de farinha, e eu, ocupada onde estava não tirava os olhos da menina. Mesmo assim ela enfiou a mão por baixo da engrenagem, para puxar a massa da mandioca, e moeu os dedos da mão! Foi horrível e eu me desesperei. De repente chegou um carro com um senhor, que há muitos dias não aparecia na UESB e esse senhor era uma de suas vítimas do passado. Tudo aconteceu de repente. Como apareceram as pessoas, assim se foram, em demanda de Anápolis cidade vizinha de maiores recursos. Eu fiquei só, só novamente, sentindo aquela sensação que certas circunstâncias da vida nos proporcionam. Pensei, pessoas que não conheço pessoas tão insignificantes para mim. Senti a morte. Tentei partir dali e sair em busca do meu mestre Humahan. Ainda com o coração partido me lembrava das pragas de Mãe Neném a dizer: “Cruz credo, para que estas crianças, nesta situação tão precária, nesta serra!”
Sim ela tinha razão, porém, quem nos entregara aquelas crianças? Com amargura no coração cheguei ao Palácio Grená, onde o meu querido mestre me esperava. Quando o vi senti o meu coração palpitar de emoção. Desta vez era diferente. Meu querido velhinho, meu amor, estou só, estou sozinha, me ajude! Fui inventar uma fábrica de farinha de mandioca e aleijei uma menina!
“Não blasfemes, não permito que digas assim. Destes apenas uma oportunidade a Isadora para se reajustar ao lado de quem fez tanto mal".
Olha Neiva!, assim como existe um único Deus, existe uma só verdade. Como poderá conhecer a verdade, senão na fonte original da vida? A verdade só se manifesta nos princípios espontâneos e aperfeiçoados. Quando souberes ouvir claramente a voz da verdade, despertarás as tuas faculdades espirituais e ouvirás, também, os eternos seres a te abençoar. Um dia um sol, e pequenos sóis, abrirão a tua alma, e então afastarás muitas coisas do teu caminho, encontrando com a harmonia do círculo esotérico da justiça e da verdade. Realize conscientemente a tua individualidade, desenvolvida na consciência humana. Terás a graça de Deus e farás o elixir da vida, tudo resultante da tua consciência. É pela caridade que os santos consolam os criminosos da lei de Deus, ou melhor, os que violam as leis de Deus, por cultivarem a ignorância. O homem, aqui na Terra, se deslumbra com as facilidades que esta rica paisagem lhe oferece. Filha, existe um átomo, ou partícula anti-material, que se compõe das anti-qualidades do átomo, a anti-matéria. Filha, o átomo que separa o etérico do físico, o nêutron, este quando isolado um do outro, a matéria, do qual você conhece uma pequena parte, porém igual, igualzinho a este, e esse mundo está em nossas cabeças, com leis, ternura e paz. Não existe separação, apenas se separam, isto é, quando tem separação esta é feita pela compreensão dos seus habitantes. Há outra vida, como eu já disse, em cima das nossas cabeças.
Eu perguntei espantado: então os aviões arrebentam tudo quando passam?
“Neiva, veja bem o que eu disse anteriormente: é uma questão de velocidade, além dos parâmetros do mundo material, que determina a anti-matéria chocar-se com a matéria, uma aniquilando a outra. Essa partícula anti-matéria se encontra no plexo. Ela cresce e se transforma para sempre se chocar e aniquilar o físico, o corpo matéria, destrutível, temporário. O corpo físico é feito pelas partículas de sua energia vital, mais denso, porém sempre é alimentado pela anti-matéria, que é mais sutil”.
E os nossos cientistas, que dizem disso? Perguntei.
Eles se tornarão autênticos quando souberem lidar com as partículas anti-matéria e conhecer suas qualidades. A química, com o calor, separa as partículas.
Oh, meu Deus!, não foi isto que eu vim buscar, meu Mestre!
Neném te fala sempre em materialização, sem conhecer o fenômeno que materializa o anti-material e tu, uma clarividente, não poderás cair no mesmo erro. Salve Deus!, Neiva, enquanto estamos aqui concentrados, tu e eu, é pela virtude de um fenômeno do anti-material, que separou o teu plexo, para operar o fenômeno de estar aqui e simultaneamente em tua casa na UESB! Enquanto a tua menina, digo, Isadora, ela terá o mínimo de sua prova.
Dei um gemido. Oh, meu Deus, é tão complexo! A minha vida que era simples e tão clara, agora transbordava de dúvidas e conflitos. Quando voltei ao corpo estava melhor. Realmente a menina não havia perdido nenhum dedo, ou melhor, somente um dedo, exatamente o do anel, que ela, como Isadora, usava para carregar o veneno, um processo que era usado pelos Borjias. Foi triste, porém tudo passou. Passei então aqueles dias num misto de sonhos e de realidades, de dúvidas e de conflitos. Me batia, “sem uma irmã”, naquela serra em desespero e desatino. Comecei a perder a noção do tempo e a me enganar nas datas dos acontecimentos, dando margem a que as pessoas começassem a duvidar de mim.Oh, meu Deus! Tudo me parecia fantástico, como se eu estivesse louca. Tudo, tudo parecia se comprimir em minha cabeça. Porém comecei a guardar segredo de tudo que via e ouvia.
Sentia que estava me preparando para alguma coisa boa, porém sempre com um pensamento que me dava forças: vou embora qualquer dia desses. Sentei no velho pequizeiro, perto da minha casa, no banco de tábuas feito pelos meus meninos. Nesse dia eu estava terrivelmente desajustada. Fechei os olhos, pedindo forças, quando Pai João de Enoque chegou de mansinho. “Fia. Os espíritos do astral inferior gostam de se aproveitar dos grandes médiuns quando estão descontrolados. Irritação, perturbação, você tem que ser diferente”.
Salve Deus! Por que seria eu diferente? Pensei: se Mãe Neném é tão sabia, como pode a minha cabeça guardar tanta coisa? Enquanto isso, os comentários continuavam, porém em bons termos; todos começavam a sentir o fenômeno do carma. Era uma tarde fria, eu não me sentia bem e me recolhi. Já estava deitada, a mercê dos meus pensamentos, quando ouvi os gritos terríveis de um obsediado. Era uma moça. Saímos todos correndo para o Templo. Mãe Neném fez a abertura e leu o Evangelho. Começaram as puxadas. Eu ia no mesmo embalo, quando ouvi a voz de Amanto.
Filha, quando chegar um caso desses, leve seu pensamento a Deus e faça uma pequena concentração até os demais incorporarem.
Era tudo tão difícil. Comecei a ter medo. Em meio daquela confusão me desprendi até Umahan, que estava lavando o rosto em uma bonita bacia. Oh, me perdoe! Só agora notava que os horários eram diferentes.
Oh, filha!...Disse ele. Não existe horário para nós, somente hoje me pegaste desprevenido. Porém, muitas vezes, eu não estava sentado naquele tapete como tu me vias, tu me vias sentado, em corpo fluídico. No entanto, o meu corpo físico, o meu pobre corpo, estava dormindo em cima, no dormitório, onde dormem também, mais dois outros ramas.
Oh, meu Deus!, como é complexa a minha vida!
Sim, filha, quanto mais penetramos no mundo psíquico, mais difícil se trona a marcha da vida. Achamo-nos na situação de viajantes, que atravessam uma região que antes nunca foi percorrida por alguém. Tem que caminhar sem um guia, tendo como guia sua própria mente, confiando apenas na sua orientação e suas defesas.Neiva, minha Neiva, te encontra ante uma floresta virgem, cujas árvores são muitas, e o campo da visão é tua consciência diante dos problemas que se apresentam. Faça Neiva, a maior concentração de tua alma. Demonstre rigorosamente a tua alma. Demonstre vigorosamente a tua força e faça as coisas chegarem onde Seta Branca deseja que cheguem. Filha, a força é produzida pela energia bioquímica, quando a motricidade do sistema nervoso desagrega e inflama o teu plexo, e ele, instintivamente, emite sua força vital. Vai, filha, eles na UESB já estão preocupados contigo.
Cheguei à casa meio tonta, porém tive um grande susto quando vi que estava em casa e não no Templo. Perguntei ao Getúlio, vim do Templo carregada?
Carregada como?, veio caminhando, apenas calada. Até pensamos que você dormiu um pouco na hora da leitura do Evangelho.
Não, não vi nada!, estou ficando louca, qualquer hora dessas você vai me levar para um manicômio. Salve Deus! Mil coisas aconteceram. Meus filhos cresciam e eu não via uma maneira de sair dali. Levantei-me cedinho e fui me sentar no pé de pequi, quando chegou um carro cheio de gente, cujo aspecto era o pior possível. Pensei: eles estão com fome, me parece que estão vindos de longe. Vamos fazer alguma coisa para que eles possam comer. Mãe Neném adivinhou o meu pensamento.
Não Neiva, lembre-se do que diz Umahan, devemos alimentar somente a alma, temos tão pouco para repartir.
Sim, concordei. E rimos bastante. Depois desse dia senti que Mãe Neném também estava melhor, compreensiva e mais razoável, tornando as nossas dores mais amenas, nos unindo mais. Apesar do acidente continuamos a fabricar farinha. Comprei um caminhão de mandioca e com a maior dificuldade mandei Gilberto meu filho buscar. Gilberto tinha apenas 16 anos e o caminhão era dele. Ele havia saído às 10 horas da manhã e até àquela hora não aparecia. Fiquei um pouco aflita e fui até a estrada para me distrair.
Oh, meu Deus! Parece que tudo estava marcado para me testar melhor: em vez de Gilberto eis que chega o Samuel, um velho colega de estrada com o qual tinha muita afinidade. Meu Deus!, pensei, qual será a reação dele diante da minha nova vida? Pensei em correr, me esconder, porém, para onde? Nessa época já éramos 90 adultos bem conscientes e todos estavam a minha espreita, não seria possível me esconder. A essa altura já estavam me chamando. Cruz credo Neiva! Cuidado com esses motoristas. Porém, desta vez eu não era mais aquela. Levantei os olhos e disse com amor: não se preocupe minha querida Mãe Neném! Samuel mostrou-se estarrecido e disse sem vacilar o que pensava de toda aquela pobreza. Encarou-me e deparou com minha segurança. De repente, tudo mudou e ele disse: Puxa, colega velha, que mudança! Quem te viu e quem te vê. Estou gostando, sabe? O Alcides me contou. Como você tivesse quebrado.
Quebrei, disse eu, porém desta vez com segurança. A partir daí tudo foi diferente.
Neiva, disse ele, você escolheu, está realizada? Está tudo certo? Só nós não entendemos. Somos, realmente, teus amigos, e mais que amigos, irmãos. Mas o Alcides não se conforma, você sempre nos ajudou, e me abraçando com carinho continuou, estou feliz em encontrá-la assim, tão segura. Você sempre foi você mesma, eu a entendo. Eu e Lourdes, minha mulher, já frequentamos alguns terreiros e gostamos muito.
Salve Deus!, disse Mãe Neném. Eu disse: não sabia que Lourdes era espírita.
Sim, e como! Vou trazê-la aqui se Deus quiser.
Lourdes, a esposa dele, viajava muito conosco disse eu para Mãe Neném.
Samuel disse ainda: Graças a Deus eu vivo pelo mundo para dar conforto à família.
Neiva sabe como somos felizes.
E assim Samuel desmanchava toda má impressão que meu povo tivera.
Vamos até Alexânia?
Vamos também Mãe Neném? Ela aceitou o convite.
Fomos. Eu toda feliz, pensava: quando somos verdadeiros tudo é felicidade em nós. Samuel ao se despedir disse: Neiva, quando você quiser. Você sabe, eu compro um carro. Estou as suas ordens e saiba que todos os colegas querem que você volte.
Não voltarei. Tomei a pior decisão de minha vida, e pedi para não sair daqui.
“Sei! E eu falando casamento”.
Ele já se casou, adiantou Mãe Neném.
Já? Como? Ele se sujeitar a este tipo de vida? Duvido. Aquele cara é rico pra burro.
Quem?
Não gostei e ele notou que eu não tinha gostado. Calou-se com ar desdenhoso. Coitada da velha colega, com apenas trinta e três anos. Trinta e cinco, disse eu. Sim, é sinal que este negócio é verdadeiro. Samuel, você esta com um dinheiro separado para me entregar e já está esquecendo, disse eu. Ele se admirou, porque o dinheiro estava em seu bolso para me entregar. Era um dinheiro que ele me devia há dois anos. Ele tinha certeza que eu não sabia e nem tampouco cobraria a dívida, se não tivesse visto o dinheiro no seu bolso. Samuel me conhecia bem, para saber que eu jamais cobraria essa dívida. E o tempo continuou sua marcha inexorável.
Retirei-me calada, e fui esperar a minha hora, isto é, a hora em que precisassem de mim. Um pouco revoltada esperei, sem que ninguém soubesse o que estava se passando dentro de mim. Foi magnífico para eles, saíram deslumbrados com tudo que viram e souberam. Por fim queriam me convencer para que desistisse de ser umbandista. Quando tudo terminou, eu fui me encontrar com Umahan. Oh, Mestre, estou desolada, não suportarei por muito tempo esta situação, é só paulada na minha cabeça! Por quê? Porque tua cabecinha está se enchendo de coisas. Então, quando estiver bem cheia, na primeira paulada, como dissestes, sai tudo de uma só vez.
O importante é que tu és muito honesta, e só sabes dizer a verdade, porém não sabes outras coisas. E mais, tens ainda que aprender a dizer e como dizer. A tua situação é muito perigosa; tuas palavras podem ser o bálsamo curador, como poderão, também, queimar como fogo. Neném tem razão, filha.
Oh, meu Deus!, gemi, e voltei para o meu corpo. No outro dia soube de um certo homem que havia chegado. Quem? Sempre soubera que iria chegar um homem de origem estrangeira. Segundo as informações que tinha, ele seria meu companheiro, e que também era culturalmente atualizado para a Doutrina. Seria ele? Olhei na vidência e fiquei bem impressionada. Mas, Deus meu!, foi tudo tão diferente! Fomos apresentados e nos tornamos amigos. Ele logo começou a me incentivar com as minhas “viagens”. As comunicações passaram a ter mais objetivos, porque logo que eu voltava ele me explicava. Tinha um carinho fraternal comigo, que até então não tivera. Me encontrei com Umahan e lhe confiei meus pensamentos.
“Neiva, dentro dos teus grandes conceitos, vejo a pro fundida dos teus sentimentos. Quantos anos tens agora?”
34 anos e seis meses, respondi.
Sim Neiva, as obras inspiradas pelo amor dos nossos semelhantes, são as que mais pesarão na balança dos nossos corações. Tuas palavras serão sempre ouvidas, porque falas da abnegação e do sacrifício, nada em ti irá perecer, porque falarás sempre do que existe, tudo está contigo em Deus e na comunicação dos espíritos. Sim filha, todos somos livres, ninguém é de ninguém, até mesmo para desejar, escolher, fazer e obter, mas todos somos, também constrangidos a entrar nos resultados de nossas próprias obras. Foi por isso que Jesus, compreendendo que não existe direito sem obrigação, e nem equilíbrio sem consciência, nos afirmou claramente: “Conhecereis a verdade e a verdade vos fará livres”. O corpo é um estado celular no qual cada uma das células é um cidadão. Então existem encontros, como existem doenças. Como o sexo é apenas o conflito dos cidadãos, no estado provocado por ação de forças extremas, energia física que não atinge o coronário, o homem é livre até mesmo para o recusar e dominar os seus instintos.
Umahan! Falas em sexo? Eu já estou longe de ter uma vida normal. Sim filha, o sexo não é como o álcool que deteriora os poderes do nosso sol interior, porém conforme a conduta deforma e desmoraliza o destino do missionário. O escândalo distancia o missionário de sua missão. Também o homem em sua mente deformada, deturpa os fatos e as coisas. Todos os homens? Não filha, nem todos.
Porém uma grande parte. Falei no comportamento do sexo, associando a criação. Dias virão em que os pais não criarão mais seus filhos, os psicólogos e psiquiatras é que irão criá-los. Salve Deus! Pelas facilidades constantes do homem no conceito do sexo, perdem suas famílias e não chegam ao término dos seus destinos cármicos.
Oh, meu Deus! É tudo tão complexo, e a vida também complexa, como chegarei lá, meu Mestre? Estou tão cansada, de não ter onde escorar a minha cabeça. Filha, as projeções mentais, como o próprio nome indica, dependem exclusivamente do poder e da vontade emissora, de sua capacidade mais ou menos poderosa no impulso de suas ondas telepáticas. Essas projeções podem ser mentais ou fluídicas. O teu chegante é um metabólico.
“E dizendo assim, se fechou em seu canto e eu o acompanhei em paz”. Em meu canto dizia: Oh, meu Deus! Quando esta andorinha descansará sua cabeça e quão altos serão seus degraus?
Vai filha. Deves sentir a mais perfeita tolerância por todos e um interesse tão sincero pelas criaturas e pelas crenças dos que pertencem a outras religiões, igual a que demonstram pela tua, pois a religião dos outros é um caminho para o mais elevado, assim como a tua, pois também isso, deve ser feito pelo nosso amor. Agora tens aberto os teus olhos. Lembra-te filha, algumas de tuas antigas crenças, de tuas velhas cerimônias, poderão parecer absurdas, porém mantenhas firme, porque jamais farás as coisas de ti.
Oh, meu Deus, gemi, eu perdi a minha personalidade. Umahan disse ainda: Sejas condescende em tudo e seja benévola em todas as coisas. Vá agora os teus olhos estão abertos, pois Deus tem os seus planos, e um deles és tu.
Quando despertei, estava no meu corpo, pensando. Aquele velho está caducando. Fui buscar uma coisa e ele me deu outra. Lá fora todos falavam com os recém chegados. Sem entusiasmo, meio decepcionada, logo depois já estava na roda, falando, rindo. Porém o meu pensamento estava seguro do outro lado do mundo. Ficamos amigos, e mais do que amigos, irmãos, eu e o novo visitante. Com as dúvidas de ser ele o intelectual esperado por Pai Seta Branca, porém tudo passou a ser bom. Comecei a me desenvolver melhor, e tinha prazer de tê-lo ao meu lado, porque ele desvendava com carinho as minhas visões, e eu, muito doente chegava a sentir melhor. Certo dia Mãe Neném disse: “Neiva, Umahan já sabe que este homem está se apaixonando por você?
Cruz credo, ele não quer nada comigo”. O visitante vinha vindo em nossa direção e perguntou: Para onde vai Mãe Neném?
Vou para Brasília cuidar da vida, porque não tenho ninguém para cuidar de mim. Meu filho, você não sabe como é triste a vida de uma mulher sozinha.
Sim, Mãe Neném, eu pretendo passar algum tempo aqui e poderei ajudá-la. Vou levá-la no meu carro, tenho também algo a tratar em Brasília. E se apressando, disse: Vamos, Mãe Neném, vamos. Dois dias depois voltaram, porém eu já sabia de tudo.
Neiva, me disse ele, por que você não foi mais franca comigo? Dizem que você está sem medicamentos porque não pode comprar e que o Seta Branca está preparando você para um intelectual que irá descrever com certo critério esta Doutrina, Sabe Neiva? O Pai Seta Branca é sábio, porém você não quer sair daqui?
Eu terei todo respeito às coisas do nosso Pai. Por que você me fala estas coisas? Porque Mãe Neném me pediu para que eu saísse daqui da Serra e nas entrelinhas outras mesquinharias.
Sabe Neiva, me desculpe, quantos anos tem você?
35 anos, respondi, e você?
41 anos e já estou aposentado. Tive um princípio de angina e fiquei inutilizado. Sou engenheiro agrônomo. Se a medicina não progredir tenho os meus dias contados.
Puxa vida, gemi, depois que me encontrei com a espiritualidade, só ouço coisas tristes.
Não Neiva, o que eu estou lhe dizendo, antes talvez nada significasse, porém hoje lhe toca porque você esta sofrida e sente solidão. Fui desprezado por minha mulher. Ela queria um filho, porém eu tive uma doença que me impede de ter filhos. Minha mulher já está casada com outro e, inclusive, tem dois filhos e eu ainda não me equilibrei. Foi muito brusca a atitude dela. Não esperava e cai, sem saber quando me levantarei.
Você cai facilmente. Pelo que vejo essa saída com Mãe Neném lhe fez mal.
“Mutilou-me”.
Você não está preparado para tão grosseira missão.
Neiva, falar em grosseria a seu lado é uma aberração.
Sorrindo porquanto Mãe Neném e Getúlio chegavam. Salve Deus, saudou Getúlio dizendo: Mãe Neném me disse que você vai embora.
Vou Getúlio, tão logo Pai Seta Branca me libere. Vim para ser útil, mas nada sei fazer. Só sei ficar ao lado de Neiva recebendo seus ensinamentos que são pérolas.
É verdade, disse Getúlio, magoado com Mãe Neném, fique conosco precisamos de uma pessoa como você. Não o aborrece ficar ao lado de Neiva?
Não, eu e Neiva nos entendemos bem. Estamos em uma jornada Carlos, Neiva precisa de nós.
Agora estamos precisando de quem faça dinheiro, atalhou Mãe Neném, espírito não enche a barriga de ninguém.
Getúlio ficou agressivo e terminou dizendo: Se os filhos de Neiva concordassem, eu a tirava daqui. Foi constrangedor. Fiquei na maior frustração da minha vida. Nisto, Nelson Santos chegou. Era dono de um loteamento em Nova Flórida. Saí para atendê-lo quando Mãe Neném me chamou: Neiva, cuidado com esse homem. Ele está apaixonado por você e foi por isso que eu já lhe dei o “bilhete azul”. Falei que aqui não há lugar para ele.
Você está louca, Mãe Neném, eu sempre soube me manter, e nunca houve nada, nem mesmo insinuações.
Bem, de qualquer jeito você já esta avisada, Salve Deus!
Fui falar com Nelson Santos, mas ele já estava perto. “Meu Deus, disse ele, que clima pesado!”
À noite, todos estavam juntos, menos o nosso visitante. Porém eu me preocupava e fui dormir. Ouvia de longe os cantos, violões, etc. Nisto me transportei e me vi diante dele. Ele dizia: Neiva, se você for real, me ouça. Gostaria de ter coragem de lhe dizer tudo que sinto, pessoalmente. Porém não quero tirá-la de sua missão e sei também que você não me aceita. Vou embora amanhã. Não quis ouvir mais, fui para o corpo, meu coração batia descompassadamente, olhei o relógio, eram 3 horas da madrugada, bastava apenas que eu desse vinte passos e estaria com ele e tudo estaria certo. A certeza de voltar a ficar sozinha era terrível. Pensei: mais um que eu irei sacrificar. Queria apenas alguém que me ajudasse. Seriam reais meus pensamentos? Como, sacrificar alguém? Fiquei ali petrificada. Oh, meu Deus! As coisas que eram tão simples para mim, hoje se complicam tanto! Voltei, adormeci e fui ter com Umahan. Ele disse: “Neiva, tu estás confusa?”
Não, respondi.
Neiva, o amor à doutrina de Jesus se resume a todos os sentimentos, porque todo trabalho sincero nos eleva a alma e traz a benção das lágrimas consoladoras.
Sim Mestre, vim vencer a minha tristeza, o fracasso, a frustração, o desejo da esperança da própria vida, falta ou perda de um bem ou de um mal, a minha existência, esta insegurança que me mata, meu Mestre.
Verdade Neiva, pela primeira vez te vejo serena e dolorida. A certeza de ser amada e a insegurança de amar alguém. Sofres muito, ainda trazes profundas cicatrizes e o teu espírito honesto não permite que alguém sofresse o que estás sofrendo.
Mestre, você me confunde.
Não filha, foi à maneira brutal dos que te cercam, de sua má interpretação.
Preciso dele, Mestre.
Não filha, não será ele. Já te disse: Vinte anos sem irmã ou irmão.
Sai dali meio decepcionada e deixei que as coisas acontecessem no outro dia. Tudo já estava sob controle, inclusive eu. Porém eu sentia que cada desilusão ia matando os restinhos que me restavam. Lembrei-me de Umahan: Cuidado filha, se persistes em viver dentro do ontem, é lógico o teu temor pelo amanhã. Será como aquele que deixou os caminhos que lhe traziam afeto e chorou a tragédia da solidão. Choram também os que não sabem perdoar as faltas alheias. Sofrem também quem perdoa quando está sofrido. O homem sofrido não é o mesmo que está tranqüilo. Chegando perto, ouvi o que as crianças falavam: Carmem Lúcia, Marlyzinha, Marisia, Miriam, Marlene e Linda a jovem e grande médium de quem tenho tantas saudades. Jair, Mãe Neném, Isidoro, Paulo e outros que não me dão tempo. Foi à hora da partida; saudades, tristeza. Finalmente eu percebi que era demais e fui embora, ficando triste, muito triste, até entender. Parti para Taguatinga e fui me adaptar a um novo mundo. Recebi Koatay 108, fui tirar uma fotografia e registrar a minha vida iniciática. Dali parti para outra jornada e que Deus nos ajude logo. Me encaminhei nesta faixa iniciática resplandecente: Vale do Amanhecer. Os dias se passavam e as minhas esperanças iam se acabando. As comunicações falavam sempre de um companheiro que ia chegar em minha vida e que seria a luz luminosa no caminho missionário desta jornada. Algumas vezes eu o via na minha clarividência, porém eu pensava: “vinte anos sem irmã ou irmão”. Cogitando esse companheiro evangélico, de que dizia Umahan, atravessei a jornada da UESB. Getúlio Volnei cada vez mais queria se libertar de mim. Até que um dia chegou a minha porta um viajante com sua bagagem missionária espiritual; a bagagem do viajante não me confundia! Vi logo que se tratava do meu companheiro. Trazia como Jaguar, uma bagagem de desilusões e frustramentos. Chegando, foi penetrando na doutrina e tomando o lugar ao lado do doutrinador e até hoje, juntos na missão, em um só coração e um só pensamento, vivemos o doutrinador. Somos almas afins, nos amamos muito e hoje, 1985 temos 20 anos juntos e abraçamos nossa vida conjugal com muito amor. Juntos, temos o nosso amor incondicional, dentro da doutrina, a minha realização, por ter ao meu lado o Mestre Jaguar Tumuchy Mário Sassi. Espero que Jesus me dê forças para continuar o caminho do Sol.
Não Neiva, o que eu estou lhe dizendo, antes talvez nada significasse, porém hoje lhe toca porque você esta sofrida e sente solidão. Fui desprezado por minha mulher. Ela queria um filho, porém eu tive uma doença que me impede de ter filhos. Minha mulher já está casada com outro e, inclusive, tem dois filhos e eu ainda não me equilibrei. Foi muito brusca a atitude dela. Não esperava e cai, sem saber quando me levantarei.
Você cai facilmente. Pelo que vejo essa saída com Mãe Neném lhe fez mal.
“Mutilou-me”.
Você não está preparado para tão grosseira missão.
Neiva, falar em grosseria a seu lado é uma aberração.
Sorrindo porquanto Mãe Neném e Getúlio chegavam. Salve Deus, saudou Getúlio dizendo: Mãe Neném me disse que você vai embora.
Vou Getúlio, tão logo Pai Seta Branca me libere. Vim para ser útil, mas nada sei fazer. Só sei ficar ao lado de Neiva recebendo seus ensinamentos que são pérolas.
É verdade, disse Getúlio, magoado com Mãe Neném, fique conosco precisamos de uma pessoa como você. Não o aborrece ficar ao lado de Neiva?
Não, eu e Neiva nos entendemos bem. Estamos em uma jornada Carlos, Neiva precisa de nós.
Agora estamos precisando de quem faça dinheiro, atalhou Mãe Neném, espírito não enche a barriga de ninguém.
Getúlio ficou agressivo e terminou dizendo: Se os filhos de Neiva concordassem, eu a tirava daqui. Foi constrangedor. Fiquei na maior frustração da minha vida. Nisto, Nelson Santos chegou. Era dono de um loteamento em Nova Flórida. Saí para atendê-lo quando Mãe Neném me chamou: Neiva, cuidado com esse homem. Ele está apaixonado por você e foi por isso que eu já lhe dei o “bilhete azul”. Falei que aqui não há lugar para ele.
Você está louca, Mãe Neném, eu sempre soube me manter, e nunca houve nada, nem mesmo insinuações.
Bem, de qualquer jeito você já esta avisada, Salve Deus!
Fui falar com Nelson Santos, mas ele já estava perto. “Meu Deus, disse ele, que clima pesado!”
À noite, todos estavam juntos, menos o nosso visitante. Porém eu me preocupava e fui dormir. Ouvia de longe os cantos, violões, etc. Nisto me transportei e me vi diante dele. Ele dizia: Neiva, se você for real, me ouça. Gostaria de ter coragem de lhe dizer tudo que sinto, pessoalmente. Porém não quero tirá-la de sua missão e sei também que você não me aceita. Vou embora amanhã. Não quis ouvir mais, fui para o corpo, meu coração batia descompassadamente, olhei o relógio, eram 3 horas da madrugada, bastava apenas que eu desse vinte passos e estaria com ele e tudo estaria certo. A certeza de voltar a ficar sozinha era terrível. Pensei: mais um que eu irei sacrificar. Queria apenas alguém que me ajudasse. Seriam reais meus pensamentos? Como, sacrificar alguém? Fiquei ali petrificada. Oh, meu Deus! As coisas que eram tão simples para mim, hoje se complicam tanto! Voltei, adormeci e fui ter com Umahan. Ele disse: “Neiva, tu estás confusa?”
Não, respondi.
Neiva, o amor à doutrina de Jesus se resume a todos os sentimentos, porque todo trabalho sincero nos eleva a alma e traz a benção das lágrimas consoladoras.
Sim Mestre, vim vencer a minha tristeza, o fracasso, a frustração, o desejo da esperança da própria vida, falta ou perda de um bem ou de um mal, a minha existência, esta insegurança que me mata, meu Mestre.
Verdade Neiva, pela primeira vez te vejo serena e dolorida. A certeza de ser amada e a insegurança de amar alguém. Sofres muito, ainda trazes profundas cicatrizes e o teu espírito honesto não permite que alguém sofresse o que estás sofrendo.
Mestre, você me confunde.
Não filha, foi à maneira brutal dos que te cercam, de sua má interpretação.
Preciso dele, Mestre.
Não filha, não será ele. Já te disse: Vinte anos sem irmã ou irmão.
Sai dali meio decepcionada e deixei que as coisas acontecessem no outro dia. Tudo já estava sob controle, inclusive eu. Porém eu sentia que cada desilusão ia matando os restinhos que me restavam. Lembrei-me de Umahan: Cuidado filha, se persistes em viver dentro do ontem, é lógico o teu temor pelo amanhã. Será como aquele que deixou os caminhos que lhe traziam afeto e chorou a tragédia da solidão. Choram também os que não sabem perdoar as faltas alheias. Sofrem também quem perdoa quando está sofrido. O homem sofrido não é o mesmo que está tranqüilo. Chegando perto, ouvi o que as crianças falavam: Carmem Lúcia, Marlyzinha, Marisia, Miriam, Marlene e Linda a jovem e grande médium de quem tenho tantas saudades. Jair, Mãe Neném, Isidoro, Paulo e outros que não me dão tempo. Foi à hora da partida; saudades, tristeza. Finalmente eu percebi que era demais e fui embora, ficando triste, muito triste, até entender. Parti para Taguatinga e fui me adaptar a um novo mundo. Recebi Koatay 108, fui tirar uma fotografia e registrar a minha vida iniciática. Dali parti para outra jornada e que Deus nos ajude logo. Me encaminhei nesta faixa iniciática resplandecente: Vale do Amanhecer. Os dias se passavam e as minhas esperanças iam se acabando. As comunicações falavam sempre de um companheiro que ia chegar em minha vida e que seria a luz luminosa no caminho missionário desta jornada. Algumas vezes eu o via na minha clarividência, porém eu pensava: “vinte anos sem irmã ou irmão”. Cogitando esse companheiro evangélico, de que dizia Umahan, atravessei a jornada da UESB. Getúlio Volnei cada vez mais queria se libertar de mim. Até que um dia chegou a minha porta um viajante com sua bagagem missionária espiritual; a bagagem do viajante não me confundia! Vi logo que se tratava do meu companheiro. Trazia como Jaguar, uma bagagem de desilusões e frustramentos. Chegando, foi penetrando na doutrina e tomando o lugar ao lado do doutrinador e até hoje, juntos na missão, em um só coração e um só pensamento, vivemos o doutrinador. Somos almas afins, nos amamos muito e hoje, 1985 temos 20 anos juntos e abraçamos nossa vida conjugal com muito amor. Juntos, temos o nosso amor incondicional, dentro da doutrina, a minha realização, por ter ao meu lado o Mestre Jaguar Tumuchy Mário Sassi. Espero que Jesus me dê forças para continuar o caminho do Sol.
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